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Vol. 81. Núm. 6.
Páginas 653-657 (Dezembro 2015)
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Avaliação da perda auditiva no colesteatoma adquirido primário e secundário
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Julia Maria Olsena, Fernando de Andrade Quintanilha Ribeirob, Mariana Mieko Mendes Yasuic, Ivan Taylor Ribeiro dos Santosc
a Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil
b Departamento de Otorrinolaringologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
c Departamento de Medicina, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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Tabelas (5)
Tabela 1. Distribuição das características demográficas segundo o tipo de colesteatoma
Tabela 2. Média do limiar ósseo (em dB) nas diferentes frequências (em kHz) segundo o tipo de colesteatoma
Tabela 3. Média do limiar aéreo (em dB) nas diferentes frequências (em kHz) segundo o tipo de colesteatoma
Tabela 4. Média do gap (em dB) nas diferentes frequências (em kHz) segundo o tipo de colesteatoma
Tabela 5. Média dos limiares auditivos (em dB) segundo o tipo de colesteatoma
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Introdução: O colesteatoma adquirido de orelha média pode ser classificado como primário e secundário. Ambos podem ocasionar perda de audição, mas ainda há controvérsia quanto à relação dos tipos de colesteatoma com a perda auditiva.

Objetivo: Analisar a relação dos tipos de colesteatoma e da erosão da cadeia ossicular com a perda auditiva.

Método: Estudo de coorte histórica com corte transversal, envolvendo pacientes que receberam o diagnóstico de colesteatoma adquirido e foram submetidos à cirurgia otológica. Foram analisados os limiares ósseos, aéreos e a diferença aéreo-óssea, e suas associações com os tipos de colesteatoma e com a presença de erosão na cadeia ossicular.

Resultados: No estudo foram incluídos oitenta pacientes, com idade entre 5 e 57 anos, sendo 51 com colesteatoma primário e 29 com colesteatoma secundário. Ambos os tipos de colesteatoma determinaram maior diferença aéreo-óssea na frequência de 0,5 kHz. O colesteatoma secundário determinou uma perda auditiva maior em todas as frequências analisadas, e maiores médias do limiar aéreo e da diferença aéreo-óssea.

Conclusão: Houve associação entre o tipo de colesteatoma e a perda de audição. O colesteatoma secundário determinou maior comprometimento da audição.

Palavras-chave:
Perda auditiva
Colesteatoma
Otite média supurativa
Audiometria

Introduction: Acquired middle ear cholesteatoma can be classified as primary or secondary. Although both can result in hearing loss, it is still controversial whether there is an association between the type of cholesteatoma and the degree of hearing loss.

Objective: To analyze the association between hearing loss and the type of acquired cholesteatoma, and the status of the ossicular chain.

Methods: This was a cross-sectional historical cohort study involving patients diagnosed with acquired cholesteatoma who were surgically treated. Air and bone conduction thresh-olds, air-bone gaps and the status of the ossicular chain were analyzed for both types of cholesteatoma.

Results: Eighty patients aged 5-57 were included in the study. Fifty-one patients had primary cholesteatoma and 29 had secondary cholesteatoma. Both types of cholesteatoma determined greater air-bone gaps at 0.5 kHz. Secondary cholesteatoma determined greater hearing loss in all analyzed frequencies and higher air conduction and air-bone gap means.

Conclusion: There was association between hearing loss and the type of cholesteatoma. Secondary cholesteatoma resulted in greater hearing impairment.

Keywords:
Hearing loss
Cholesteatoma
Suppurative otitis media
Audiometry
Texto Completo

Introdução

O colesteatoma é definido como a presença de pele em qualquer área pneumatizada do osso temporal, e pode ser congênito ou adquirido.1 O colesteatoma adquirido da orelha média pode ser classificado, de acordo com sua origem, em primário ou secundário.2-6 O primário forma-se a partir de retrações da pars flácida, e o secundário, a partir do comprometimento da pars tensa da membrana timpânica.5,7,8

Estudos demonstram que a incidência e a prevalência do colesteatoma são muito maiores em países não desenvolvidos, o que evidencia sua associação com baixo nível socioeconômico, higiene precária e demora em procurar serviços de saúde ou precariedade dos mesmos.9,10

O colesteatoma determina compressão mecânica das estruturas adjacentes e possui células com características hiperproliferativas (citoqueratina 16, KI67 e citocinas inflamatórias), podendo ocasionar erosão do osso temporal e da cadeia ossicular, provocando perda de audição.4,11,12 Por esse motivo e pela otorreia fétida, gera prejuízos psicossociais. Por ter grande impacto nas atividades de vida diária, pode causar limitação de futuras oportunidades de trabalho e dificuldade de inclusão social.9

Não há consenso na literatura em relação à influência do tipo de colesteatoma na perda auditiva e nem em relação às frequências da audição mais acometidas.11,13-17

A maioria dos estudos demonstra que existe associação entre a erosão da cadeia ossicular e a intensidade da perda de audição, e que o ossículo mais acometido é a bigorna.12,15,17

O objetivo do presente estudo foi analisar a relação dos colesteatomas adquiridos primário e secundário, assim como da erosão da cadeia ossicular, com a perda auditiva.

Método

O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição sob o número 03856512.4.0000.5479.

Trata-se de um estudo de coorte histórica com corte transversal, baseado em dados obtidos de prontuários médicos de pacientes atendidos no ambulatório de Otorrinolaringologia de uma instituição de ensino médico, entre janeiro de 2010 e outubro de 2013.

Critérios de inclusão: pacientes que receberam o diagnóstico de colesteatoma adquirido e que foram submetidos à cirurgia otológica.

Critérios de exclusão: pacientes com outras doenças otológicas concomitantes ou que haviam realizado cirurgia otológica prévia.

Todos os pacientes realizaram, previamente à cirurgia, audiometrias tonais com determinação dos limiares aéreos em 0,25; 0,5; 1-4; 6 e 8 kHz, e dos limiares ósseos em 0,5; 1-4 Hz. Foram avaliados, separadamente, os limiares aéreos, ósseos e a diferença aéreo-óssea (gap) nas frequências 0,5; 1; 2 e 4 kHz. Também foi avaliada a média nessas frequências para cada paciente.

As variáveis estudadas foram: a) idade e gênero; b) tipo de colesteatoma: definidos de acordo com dados da história clínica, do exame físico e dos achados intraoperatórios descritos no formulário padronizado da descrição cirúrgica, sendo classificados como primários quando originários de retração pars flácida, ou secundários, quando originários do comprometimento da pars tensa da membrana timpânica8; c) presença de erosão na cadeia ossicular definida por meio dos achados intraoperatórios, sendo categorizada em presente ou ausente.

A análise estatística dos dados foi realizada no programa Stata, versão 11. A associação da perda de audição com as variáveis pesquisadas foi realizada por meio do teste Quiquadrado de Pearson para as variáveis categóricas e do teste não paramétrico de Wilcoxon-Mann-Whitney para as variáveis contínuas, considerando intervalo de confiança para 95% e nível de significância de 5%.

Resultados

No estudo, foram incluídos 80 pacientes, sendo 31 do gênero feminino e 49 do gênero masculino, com idade entre 5 e 57 anos (média de 26,5 ± 14,75). A orelha esquerda foi acometida em 52,5% das vezes, e a orelha direita em 47,5%. O colesteatoma primário foi encontrado em 51 (63,8%) pacientes, e o colesteatoma secundário em 29 (36,2%). Não houve diferença estatisticamente significante entre os dois grupos, em relação ao gênero e à idade (tabela 1).

Quanto ao acometimento da audição nas diferentes frequências, verificamos que o limiar ósseo foi maior nas frequências de 2 e 4 kHz, tanto no colesteatoma primário como no secundário (tabela 2); o limiar aéreo foi maior nas frequências de 0,5 kHz e 1 kHz no colesteatoma primário e semelhante em todas as frequências no colesteatoma secundário (tabela 3); e o gap foi maior na frequência de 0,5 kHz em ambos os tipos de colesteatoma (tabela 4).

Quanto ao grau de perda auditiva, verificamos que o colesteatoma secundário determinou maior perda do que o colesteatoma primário em todas as frequências analisadas e gap maior nas frequências de 1 e 2 kHz (tabelas 3 e 4). Não houve diferença estatisticamente significante na média do limiar ósseo entre os colesteatomas primário e secundário; porém, a média do limiar aéreo e a média do gap foram maiores no colesteatoma secundário (tabela 5).

Apenas cinco (6,25%) pacientes apresentavam cadeia ossicular íntegra no momento da cirurgia, sendo dois deles com colesteatoma primário e três deles com colesteatoma secundário. Os pacientes com cadeia ossicular íntegra apresentaram gap médio de 26,25 dB (DP ± 7,55dB), e os pacientes com erosão da cadeia ossicular, de 31,77 dB (DP ± 13,54 dB).

Isso poderia explicar a alta prevalência da erosão da cadeia ossicular e o maior grau de perda de audição encontrado.

O presente estudo apresenta algumas limitações. Trata-se de um estudo composto pelo universo de pacientes atendidos em um ambulatório, e não por uma amostra aleatória dos mesmos, o que diminui a sua generalidade. Além disso, a inexistência de informações sobre as características socioeconômicas dos pacientes e sobre o tempo de doença impossibilita a investigação de possíveis associações dessas variáveis com a perda auditiva e o aprofundamento de explicações para a alta prevalência de erosão da cadeia ossicular.

Discussão

O objetivo deste estudo foi, primariamente, verificar a relação dos tipos de colesteatoma com a perda auditiva e, secundariamente, a relação da cadeia ossicular com o acometimento auditivo.

Os dois tipos de colesteatoma determinaram maior gap nas frequências graves, sendo a de 0,5 kHz acometida em maior grau. Assim como relatado na literatura,18,19 neste estudo foram observados preservação do limiar ósseo e maior acometimento do limiar aéreo nessas frequências.

A diferença da perda auditiva entre os dois tipos de colesteatoma ainda é controversa na literatura, pois as diferentes metodologias utilizadas dificultam a comparação dos resultados.12,18,19 Teoricamente, pela sua localização, o colesteatoma secundário acometeria em maior grau a parte tensa da membrana timpânica, a bigorna e o estribo, acarretando maior perda auditiva. Essa premissa foi confirmada por este estudo, no qual o colesteatoma secundário mostrou-se associado a maior grau de perda auditiva. Foi encontrada perda auditiva de grau leve no colesteatoma primário e de grau moderado no colesteatoma secundário; achados maiores que os relatados em outros estudos.17-19

A literatura clássica relata que a intensidade da perda auditiva não é um bom preditor da condição da cadeia ossicular.15,16 Contudo, estudos recentes demonstram que a perda de audição está associada à erosão da cadeia ossicular, sendo a bigorna o ossículo com maior influência nos limiares auditivos.12,19 No presente estudo, a falta de informação sobre o ossículo acometido e o pequeno número de casos com cadeia ossicular íntegra no momento da cirurgia impediram a análise da associação entre a perda de audição e a condição da cadeia ossicular.

O estudo foi conduzido em um serviço de saúde público, onde as consultas com especialistas e a realização de exames complementares e de tratamento cirúrgico ainda levam um longo tempo.20 Com isso, o intervalo entre o início dos sintomas do paciente e seu diagnóstico e tratamento é grande.

Conclusões

O tipo de colesteatoma adquirido determinou diferenças estatisticamente significantes na perda auditiva. O colesteatoma secundário determinou maior comprometimento do limiar aéreo e da diferença aéreo-óssea que o colesteatoma primário. Além disso, ambos os tipos de colesteatoma determinaram maior comprometimento da diferença aéreo-óssea nas frequências mais graves.

Financiamento

Este estudo foi financiado pela Bolsa de Iniciação Científica PIBIC – CNPq.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.


Recebido em 3 de julho de 2014;

aceito de 23 de novembro de 2014

DOI se refere ao artigo: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.11.009

* Autor para correspondência.

E-mail:juolsen@hotmail.com (J.M. Olsen).

Como citar este artigo: Olsen JM, Ribeiro FAQ, Yasui MMM, dos Santos ITR. Hearing loss assessment in primary and secondary acquired cholesteatoma. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81:653-7.

☆☆ Instituição: Departamento de Otorrinolaringologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
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