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Vol. 86. Núm. 6.
Páginas 720-726 (Novembro - Dezembro 2020)
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Vol. 86. Núm. 6.
Páginas 720-726 (Novembro - Dezembro 2020)
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Development of auditory and language skills in children using cochlear implants with two signal processing strategies
Desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem em crianças usuárias de implante coclear com duas estratégias de processamento de sinal
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Tatiana Mendes de Meloa,
Autor para correspondência
tati_usp@yahoo.com.br

Autor para correspondência.
, Elisabete Honda Yamagutib, Adriane Lima Mortari Moretc, Orozimbo Alves Costad, Natália Barreto Frederigue Lopesc
a Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil
b Universidade de São Paulo (USP), Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais, Seção de Implante Coclear, São Paulo, SP, Brasil
c Universidade de São Paulo (USP), Departamento de Fonoaudiologia, Bauru, SP, Brasil
d Universidade de São Paulo (USP), Bauru, SP, Brasil
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Tabela 1. Características demográficas das crianças avaliadas
Abstract
Introduction

The increase in the spectral information offered by the sound processing strategy HiRes 120 has led to great expectations for the pediatric population. Due to a shorter duration of auditory deprivation and higher neural plasticity, children could benefit more substantially from the spectral information of this sound processing strategy.

Objective

To compare auditory and language skills in Brazilian children with cochlear implants using the HiRes and HiRes 120 sound processing strategies.

Methods

Thirty children, aged 1–3 years, with congenital hearing loss, were divided into two groups, according to the signal processing strategy adjusted at the time of the cochlear implant activation. The assessed children were matched according to chronological age and the time of the cochlear implant use. The auditory and language skills were evaluated longitudinally through the Infant‐Toddler Meaningful Auditory Integration Scale and Production Infant Scale Evaluation, carried out before surgery, and 3, 6 and 12 months after device implantation. The Mann‐Whitney test was applied for the comparison between the two groups with a 5% significance level.

Results

The findings indicated development of hearing and language skills in the first year of cochlear implant use; however, there was no statistically significant difference in the evolution of such skills due to the adjusted processing strategy in the activation of the cochlear implant electrodes.

Conclusion

The development of auditory and language skills in the assessed children was similar during the entire study period, regardless of which signal processing strategy was used.

Keywords:
Hearing loss
Cochlear implant
Child
Language
Auditory perception
Resumo
Introdução

O aumento das informações espectrais proporcionado pela estratégia de processamento de sinal HiRes 120 gera expectativas em relação à população pediátrica, uma vez que, devido ao curto período de privação sensorial e da maior plasticidade neural, as crianças poderiam se beneficiar de forma mais substancial das informações espectrais dessa estratégia de processamento de sinal.

Objetivo

Comparar as habilidades auditivas e de linguagem em crianças usuárias de implante coclear, com a estratégia de processamento de sinal HiRes e HiRes 120.

Método

Trinta crianças de um a três anos e com perda auditiva congênita foram divididas em dois grupos, de acordo com a estratégia de processamento de sinal ajustada no momento da ativação do implante coclear. As crianças avaliadas foram pareadas de acordo com a idade cronológica e o tempo de uso do implante coclear. As habilidades auditivas e de linguagem foram avaliadas, longitudinalmente, por meio do Infant‐Toddler Meaningful Auditory Integration Scale e Production Infant Scale Evaluation, antes do implante coclear e com 3, 6 e 12 meses de uso do dispositivo. O teste estatístico de Mann‐Whitney foi aplicado para comparar os resultados dos grupos, com nível de significância de 5%.

Resultados

Os achados indicaram desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem no primeiro ano de uso do implante coclear, porém sem diferença estatisticamente significante na evolução de tais habilidades, em função da estratégia de processamento ajustada na ativação dos eletrodos do implante coclear.

Conclusão

O desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem das crianças avaliadas foi semelhante durante o período do presente estudo, independentemente da estratégia de processamento de sinal usada.

Palavras‐chave:
Perda auditiva
Implante coclear
Criança
Linguagem
Percepção auditiva
Texto Completo
Introdução

O implante coclear (IC) representa o mais importante avanço no tratamento de indivíduos com perda de audição de grau severo e/ou profundo bilateral que não apresentam aproveitamento com o Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI). Com o avanço tecnológico nessa área foi possível observar melhoria no desempenho auditivo dos usuários dessa tecnologia, não apenas em função da ampliação dos critérios de indicação do IC, como também no seu aprimoramento tecnológico, em relação ao feixe de eletrodos, à tecnologia do microfone, às estratégias de processamento de sinal e aos algoritmos de pré‐processamento.1

O desempenho auditivo e linguístico dos usuários de IC está intimamente relacionado a fatores como a idade na cirurgia,2,3 o tempo de privação sensorial,4,5 o uso efetivo do dispositivo,6 a etiologia da deficiência auditiva,7–9 habilidades cognitivas da criança,10 participação da família no processo terapêutico,11 terapia fonoaudiológica especializada12 e aprimoramento dos parâmetros de programação,13–16 entre outros fatores.

Entre os diferentes parâmetros de programação ajustados no momento do mapeamento, a estratégia de processamento de sinal adotada definirá como a informação acústica será convertida em estímulo elétrico. O objetivo é que o sinal elétrico seja representado de forma mais próxima à informação acústica captada pelo microfone do IC.

No Brasil, os produtos das fabricantes de IC Advanced Bionics, Cochlear Corporation, Med‐El e Oticon Medical são aprovados para venda pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). As diferentes empresas de IC orientam os fonoaudiólogos da equipe de IC sobre a estratégia de processamento de sinal recomendada para cada modelo do dispositivo. Contudo, é extremamente importante o olhar clínico para a avaliação dos resultados pós‐IC, nas diferentes estratégias de processamento de sinal, uma vez que às vezes a estratégia preconizada pela empresa não beneficia todos os usuários de IC da mesma forma.15,16

Os dispositivos da Advanced Bionics começaram a ser vendidos no início da década de 1990, com os IC Clarion 1.0 e 1.2. Um grande avanço tecnológico para esses dispositivos foi o lançamento da estratégia de processamento de sinal HiResolution (HiRes), que proporcionou maior detalhamento temporal da informação acústica comparada às estratégias de processamento de sinal usadas anteriormente. Esse maior detalhamento proporcionou melhores resultados em relação à percepção auditiva, inteligibilidade de fala e linguagem oral em usuários de IC de todas as faixas etárias, quando comparado aos resultados de gerações anteriores de estratátegias de processamento de sinal.17–20

Uma das limitações do IC é a lacuna no detalhamento da informação espectral transmitida, seja pela sobrevivência irregular das fibras auditivas remanescentes no local onde o eletrodo está posicionado, seja também pelo número limitado de contatos ativos no feixe de eletrodos. Diante dessa limitação, em 2012 a mesma empresa implantou uma nova estratégia de processamento de sinal, a HiRes 120, que incorpora o detalhamento de características espectrais, por meio da aplicação da técnica dos canais espectrais virtuais. Dessa forma, a HiRes 120 possibilitou o aumento no número de sítios de estimulação intracoclear e, consequentemente, proporcionou maiores informações espectrais para o usuário de IC, juntamente com os demais benefícios já proporcionados com a estratégia HiRes. Em função das características dessa estratégia de processamento de sinal, os usuários dessas estratégias podem obter melhoria no desempenho da percepção da fala no ruído e percepção musical.21–23

A implantação da HiRes 120 na população pediátrica é mais recente em comparação com estudos feitos na população adulta e leva a grandes expectativas. Acredita‐se que a melhoria da informação espectral deve ser mais útil em casos de grande sobrevivência neural, como em crianças. Devido ao curto período de privação sensorial e da maior plasticidade neural residual, as crianças podem se beneficiar de forma mais substancial das informações espectrais dessa estratégia de processamento de sinal.24

Considerando as questões citadas acima e a lacuna de estudos científicos que analisem o desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem de crianças usuárias de IC com a HiRes e HiRes 120, torna‐se necessário verificar qual estratégia de processamento de sinal da Advanced Bionics pode proporcionar melhores resultados em relação ao desenvolvimento de tais habilidades em crianças com esse dispositivo implantado.

Objetivo

Comparar, longitudinalmente, as habilidades auditivas e de linguagem em crianças usuárias de implante coclear no primeiro ano de uso do IC com a estratégia de processamento de sinal HiRes e a HiRes 120.

Método

Estudo longitudinal retrospectivo, feito na seção de Implante Coclear do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo e aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa dessa Instituição, sob ofício n° 217/2011.

Casuística

Foram avaliadas 30 crianças com deficiência auditiva neurossensorial de grau severo e/ou profundo, pré‐lingual, implantadas com os dispositivos 90K, da Advanced Bionics, de ambos os gêneros, regularmente matriculadas no centro de IC. Todas as crianças participantes do presente estudo foram avaliadas pela mesma equipe de profissionais, nas fases pré e pós‐cirúrgicas.

Tais crianças foram divididas em dois grupos, de acordo com a estratégia de processamento de sinal usada no primeiro ano de IC, pareadas de acordo com a idade cronológica no momento da cirurgia e tempo de privação sensorial:

Grupo HiRes – 15 crianças usuárias de IC, usuárias da estratégia de processamento de sinal HiRes, desde o momento da ativação dos eletrodos;

Grupo HiRes 120 – 15 crianças usuárias de IC, usuárias da estratégia de processamento de sinal HiRes 120, desde o momento da ativação dos eletrodos.

Das crianças do grupo HiRes, uma apresentava deficiência auditiva em decorrência de meningite, uma em função de questões multifatoriais ao nascimento (prematuridade associada à internação na UTI neonatal), três apresentavam deficiência auditiva de origem genética e 10 crianças não tinham fator etiológico definido. Das crianças do grupo HiRes 120, duas apresentavam deficiência auditiva em decorrência de meningite, duas em função de questões multifatoriais ao nascimento, duas apresentavam deficiência auditiva de origem genética e nove crianças não tinham fator etiológico definido.

Todos os participantes apresentavam inserção total dos eletrodos e faziam uso efetivo do dispositivo desde a ativação (mínimo de 8 horas diárias).

Por ser um estudo retrospectivo, considerou‐se o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pelos responsáveis dos pacientes avaliados, na data da matrícula do usuário no centro de IC, que autorizou o uso das informações descritas no prontuário para fins científicos.

No momento da indicação cirúrgica do IC foram adotados os seguintes critérios para as crianças com deficiência auditiva pré‐lingual: idade de um a três anos; deficiência auditiva neurossensorial bilateral de grau severo e/ou profundo, limiares auditivos com AASI maiores do que 60dB nas frequências da fala; ausência de comprometimentos associados à deficiência auditiva; reabilitação auditiva na cidade de origem; adequação e motivação da família para o uso do IC.

Todos os participantes do estudo estavam inseridos, no momento da avaliação, em terapia fonoaudiológica com abordagem aurioral, isto é, que enfatiza a estimulação da audição para aquisição e desenvolvimento da linguagem oral.

Instrumentos

Para avaliação das habilidades auditivas foi aplicado o questionário Infant Toddler: Meaningful Auditory Integration Scale (IT‐MAIS), adaptado para o português,25 que tem a finalidade de avaliar as habilidades auditivas em crianças de até quatro anos em situações de vida diária. É um questionário estruturado em forma de escala, composto por 10 questões, aplicadas aos pais em forma de entrevista, observa três aspectos das habilidades auditivas: vínculo ao dispositivo eletrônico (o desejo de usá‐lo e a habilidade de detectar e identificar o mau funcionamento desse), atenção ao som (as respostas espontâneas da criança aos estímulos auditivos) e habilidade de atribuir significado aos fenômenos auditivos (a relação do som com seu significado). As respostas podem variar em uma escala de cinco pontos, que mostram a porcentagem em que a criança demonstra as habilidades auditivas questionadas, com pontuação de zero a quatro, ou seja, 0=nunca, a crianças apresenta 0% das habilidades auditivas avaliadas; 1=raramente, a criança apresenta 25% das vezes à habilidade avaliada; 2=ocasionalmente, a criança apresenta 50% das vezes à habilidade avaliada; 3=frequentemente, a criança apresenta 75% das vezes a habilidade avaliada e 4=sempre, a criança apresenta 100% das vezes a habilidade avaliada. A pontuação máxima alcançada no questionário é de 40 pontos ou 100%.

Para avaliação das habilidades de linguagem foi aplicado o questionário Production Infant Scale Evaluation (Prise),26 que tem como finalidade acessar a produção pré‐linguística das crianças em situações de vida diária. É composto por 11 questões, aplicadas aos pais em forma de entrevista. As opções de resposta variam em uma escala de cinco pontos, que mostram a porcentagem em que a criança demonstra a habilidade pré‐linguística perguntada, com pontuação de 0 a 4, ou seja, 0=nunca, a crianças apresenta 0% da habilidade pré‐linguística avaliada; 1=raramente, a criança apresenta 25% das vezes a habilidade avaliada; 2=ocasionalmente, a criança apresenta 50% das vezes a habilidade avaliada; 3=frequentemente, a criança apresenta 75% das vezes a habilidade avaliada e 4=sempre, a criança apresenta 100% das vezes a habilidade avaliada. A pontuação máxima alcançada no questionário é de 44 pontos ou 100%.

Procedimentos

Todas as crianças matriculadas no centro de IC foram acompanhadas regularmente, no primeiro ano de uso do dispositivo, a cada três meses. Nessa rotina de atendimento foram aplicados diversos procedimentos, inclusive os questionários IT‐MAIS e Prise. Dessa forma, para o presente estudo, foram levantados nos prontuários dos participantes os resultados dos questionários citados anteriormente na etapa de avaliação pré‐operatória (pré‐IC) e nos retornos de acompanhamento de 3, 6 e 12 meses de uso do IC.

Análise dos resultados

A análise dos resultados foi feita por meio de estatística descritiva dos dois grupos do estudo. Posteriormente, foi feita a análise estatística inferencial por meio do teste de Mann‐Whitney, para comparar os resultados dos questionários IT‐MAIS e Prise, nos diferentes momentos avaliados. Para a análise estatística, empregou‐se o pacote computacional Stata, versão 9.0 e nível de significância de 5%.

Resultados

As características demográficas dos participantes do estudo podem ser visualizadas na tabela 1. De acordo com os achados obtidos, não houve diferença entre os grupos em relação à idade e o tempo de privação sensorial.

Tabela 1.

Características demográficas das crianças avaliadas

  Média  Desvio‐padrão  Mínimo  Máximo 
Idade (meses)          1,00
Grupo HiRes  26,2  8,3  14  41 
Grupo HiRes 120  25,5  8,1  12  40 
Tempo de privação (meses)          0,91
Grupo HiRes  27,0  8,3  15  42 
Grupo HiRes 120  26,6  8,0  13  41 

Os resultados obtidos no IT‐MAIS e na Prise em ambos os grupos, ao longo do período do estudo, podem ser observados nas figuras 1 e 2. Os achados revelam que, independentemente da estratégia de processamento de sinal usada, houve desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem de forma estatisticamente significante no primeiro ano de uso do IC.

Figura 1.

Desempenho das habilidades auditivas das crianças avaliadas, por meio do questionário IT‐MAIS, na avaliação pré‐IC e após 3, 6 e 12 meses de uso do IC. O asterisco indica diferença estatisticamente significante entre os grupos, nos diferentes momentos do estudo (p <0,05).

(0,08MB).
Figura 2.

Desempenho das habilidades linguísticas das crianças avaliadas, por meio da Prise, na avaliação pré‐IC e após 3, 6 e 12 meses de uso do IC. O asterisco indica diferença estatisticamente significante entre os grupos, nos diferentes momentos do estudo (p <0.05).

(0,1MB).

Ao comparar o desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem do grupo de crianças ativadas em função da estratégia de processamento de sinal, não foi possível observar diferenças estatisticamente significantes entre os grupos, em nenhum dos momentos avaliados, embora haja uma tendência de melhores resultados no grupo que usou a estratégia HiRes, a partir do terceiro e sexto mês de uso do IC (figs. 3 e 4), para as habilidades auditivas e de linguagem, respectivamente.

Figura 3.

Desempenho das habilidades auditivas, avaliado por meio do questionário IT‐MAIS, nos diferentes momentos avaliados pelo estudo, de acordo com a estratégia de processamento de sinal programada na ativação do IC.

(0,12MB).
Figura 4.

Desempenho das habilidades linguísticas, avaliado por meio da Prise, nos diferentes momentos avaliados pelo estudo, de acordo com a estratégia de processamento de sinal programada na ativação do IC.

(0,12MB).
Discussão

O presente estudo teve como objetivo comparar, longitudinalmente, as habilidades auditivas e de linguagem em crianças usuárias de implante coclear no primeiro ano de uso do IC, com a estratégia de processamento de sinal HiRes e a HiRes 120, a fim de proporcionar maior embasamento aos profissionais da área para aprimoramento dos parâmetros de programação do dispositivo.

Os achados obtidos apontam notório desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem no primeiro ano de uso de IC, sem diferença na evolução de tais habilidades em função da estratégia de processamento ajustada a partir da ativação dos eletrodos do IC.

A estimulação elétrica proporcionada pelo uso efetivo do IC, associada à reabilitação auditiva, possibilita o desenvolvimento das vias auditivas superiores. Quando a cirurgia é feita de forma precoce, possibilita que esse desenvolvimento ocorra de forma concomitante com o período crítico de maturação desse sistema sensorial, proporciona melhores oportunidades para aquisição das habilidades auditivas e de linguagem.2,3,6,12,27,28

O questionário IT‐MAIS tem sido amplamente usado em âmbito nacional e internacional para acompanhar o desenvolvimento das habilidades auditivas, em especial nos primeiros anos de uso do IC, por meio da observação do comportamento auditivo. Os achados evidenciaram evolução de tais habilidades ao longo do primeiro ano de uso do dispositivo, de forma estatisticamente significante, em ambos os grupos avaliados (fig. 1).

É possível notar ainda que, mesmo antes da ativação do IC (avaliação pré‐IC), as crianças avaliadas já apresentavam um desenvolvimento inicial das habilidades auditivas. A avaliação do benefício proporcionado pelo AASI é fundamental no processo de indicação do IC e, com a adaptação desse dispositivo, é possível que o sinal acústico amplificado possibilite o desenvolvimento inicial do comportamento auditivo.

A escala Prise, usada neste estudo para avaliação das habilidades de linguagem no primeiro ano de uso do IC, avalia o desenvolvimento pré‐linguístico e é extremamente importante como indicador da aquisição e desenvolvimento da linguagem nas crianças implantadas. De acordo com a literatura,26 as crianças com deficiência auditiva de grau severo e/ou profundo apresentam escore abaixo de 50% nessa escala, independentemente da idade cronológica da criança, no momento pré‐cirúrgico, o que corrobora os resultados apresentados pelos participantes do presente estudo antes da cirurgia do IC. Contudo, há um aumento das vocalizações (indiferenciadas e diferenciadas) após o IC, independentemente da estratégia de processamento de sinal usada, que pode ser atribuído pelo feeedback auditivo proporcionado pelo dispositivo (figs. 2 e 4).

Ao comparar o desenvolvimento da audição no primeiro ano de uso do IC dos dois grupos estudados evidencia‐se que houve uma tendência das crianças usuárias da estratégia HiRes apresentarem melhor desempenho das habilidades avaliadas a partir do terceiro mês. Contudo, tal diferença não é estatisticamente significante em qualquer dos intervalos avaliados (fig. 3).

Em relação às habilidades de linguagem, essa tendência de melhores resultados com a estratégia de processamento de sinal HiRes esteve presente a partir do 6° mês de uso do dispositivo, porém, mais uma vez, a diferença de desempenho linguístico nos dois grupos estudados não é estatisticamente significante em qualquer momento do estudo (fig. 4).

A literatura existente até o momento evidencia que a estratégia HiRes 120 proporciona melhores resultados em testes de percepção da fala no ruído e na apreciação musical para usuários dessa estratégia.22,24 Embora a estratégia de processamento de sinal HiRes 120 possa proporcionar maior detalhamento espectral do sinal acústico, com o aumento do número de sítios de estimulação intracoclear, associado à maior resolução temporal já existente na estratégia HiRes, tal característica parece não ter contribuído para um maior ritmo de desenvolvimento das habilidades auditivas e linguísticas no primeiro ano de uso do IC.

O presente estudo é precursor na investigação do desenvolvimento auditivo e de linguagem no primeiro ano de uso IC, em função da estratégia de processamento de sinal ajustada na programação do dispositivo, auxilia assim os fonoaudiólogos que atuam com mapeamento a compreender a importância do olhar clínico do profissional no acompanhamento do usuário ao longo do uso do dispositivo.

Limitações do estudo também devem ser consideradas. Apesar da tendência de as crianças usuárias da estratégia HiRes apresentarem melhor desempenho das habilidades avaliadas, um grupo maior de crianças avaliadas poderia apontar uma diferença significante entre os grupos. Nesse contexto, é importante a continuidade de investigações nessa área, uma vez que, em geral, as empresas fabricantes do IC recomendam o uso de determinados ajustes para a programação dos dispositivos de seus usuários. Entretanto, os parâmetros recomendados podem não beneficiar todos os pacientes da mesma forma.

Conclusão

O desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem das crianças avaliadas foi semelhante durante o período do presente estudo, independentemente da estratégia de processamento de sinal usada.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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Como citar este artigo: Melo TM, Yamaguti EH, Moret AL, Costa OA, Lopes NB. Development of auditory and language skills in children using cochlear implants with two signal processing strategies. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:720–6.

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