Compartilhar
Informação da revista
Vol. 88. Núm. 1.
Páginas 141-145 (Janeiro - Fevereiro 2022)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
4471
Vol. 88. Núm. 1.
Páginas 141-145 (Janeiro - Fevereiro 2022)
Relato de caso
Open Access
Hiperplasia endotelial papilar intravascular (tumor de Masson) do seio maxilar
Visitas
4471
François Voruz1,a,
Autor para correspondência
francois.voruz@hcuge.ch

Autor para correspondência.
, Grégoire Arnouxb, Charles‐Arnaud Serex1,a, Claudio de Vitob, Basile Nicolas Landisa
a Geneva University Hospitals, Clinical Neurosciences Department, Otorhinolaryngology and Head and Neck Surgery, Geneva, Suíça
b Geneva University Hospitals, Diagnostic Department, Geneva, Suíça
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (3)
Mostrar maisMostrar menos
Tabelas (1)
Tabela 1. Resumo dos casos publicados de hiperplasia endotelial papilar intravascular nasal
Texto Completo
Introdução

A hiperplasia endotelial papilar intravascular – conhecida como tumor de Masson – é uma entidade benigna rara. Foi descrita pela primeira vez em 1923 por um patologista francês sob o nome de hémangioendothéliome végétant intravasculaire.1 Atualmente, é considerada uma proliferação intravascular reativa que se desenvolve no lúmen de um vaso dilatado, um hematoma ou uma lesão vascular preexistente.2,3 Nenhuma degeneração maligna foi relatada ainda. Apresentamos três casos de tumor de Masson no seio maxilar, todos tratados com cirurgia endoscópica e inicialmente considerados potencialmente malignos. Uma revisão da literatura de outros casos encontrados nos seios paranasais da cavidade nasal é apresentada.

Relatos de casoCaso 1

Paciente do sexo masculino de 46 anos apresentou‐se com queixa de obstrução nasal esquerda e rinorreia hemorrágica ocasional por sete meses. Relatava estar sob terapia de reposição para hipotireoidismo. A endoscopia nasal revelou um pequeno pólipo no meato médio esquerdo. A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) mostraram o seio maxilar esquerdo preenchido por uma lesão de tecido mole heterogênea (fig. 1A). A ressecção transnasal foi proposta revelando um tumor de tecido mole quase avascular, sem fixação no seio maxilar e circundada por mucosa inflamatória. O curso pós‐operatório não apresentou intercorrências. A análise histológica não mostrou sinais de malignidade, e sim pontos de hiperplasia endotelial papilar em hematoma organizado. O paciente permaneceu assintomático, sem sinais endoscópicos de recorrência por 3 anos após a intervenção.

Figura 1.

(A) Paciente 1, corte coronal de TC sem contraste: preenchimento do seio maxilar esquerdo com espessamento do osso circundante. Corte coronal de RM ponderado em T2: tumor heterogêneo em seio maxilar esquerdo com retenção de líquido. (B) Paciente 2, corte coronal de TC sem contraste: preenchimento do seio maxilar direito com desmineralização da parede internasossinusal por compressão do tumor, estendendo‐se às células etmoidais circunvizinhas e fossa nasal. Corte de ressonância magnética coronal ponderado em T2: tumor do seio maxilar direito no antro com retenção de líquido. (C) Paciente 3, corte coronal de TC sem contraste: preenchimento parcial dos seios maxilares predominante à direita, com osso circundante intacto. Corte coronal de ressonância magnética ponderada em T2: tumor heterogêneo no seio do antro maxilar direito. Mucosa espessada no seio maxilar esquerdo.

(0,68MB).
Caso 2

Paciente do sexo masculino de 76 anos atendido em consulta várias vezes por epistaxe de repetição no lado direito associada a rinorreia posterior e tosse por cinco meses. Ele apresentava cardiopatia isquêmica, hipertensão arterial, colesterol elevado, gota, obesidade e tabagismo ativo (30 maços/ano). A endoscopia nasal revelou uma lesão translúcida arroxeada na cavidade nasal direita, emergindo do meato médio (fig. 2A). A TC e a RM confirmaram a presença de lesão heterogênea de tecido mole no interior do seio maxilar estendendo‐se até a cavidade nasal, com restrição de difusão parcial, associada à presença de fluido nas células etmoidais circundantes (fig. 1B). Apenas material hemorrágico insuficiente para análise foi encontrado na biópsia transnasal e uma ressecção diagnóstica foi programada. O tumor não estava inserido, fixada ou aderido às estruturas circundantes, permitindo uma resecção fácil e completa. As estruturas ósseas e mucosa adjacentes estavam intactas, sugerindo processo benigno (fig. 2B). A análise histológica revelou alteração polipoide da mucosa respiratória com focos de hiperplasia endotelial papilar em hematoma em processo de organização avançada, sem malignidade (fig. 3). O seguimento pós‐operatório foi simples e o paciente permaneceu assintomático do ponto de vista rinológico. Entretanto, devido a uma tosse persistente com hemoptise, foi feita uma tomografia computadorizada de tórax que demonstrou o que mais tarde foi confirmado como um carcinoma pulmonar de pequenas células.

Figura 2.

Paciente 2 (A) Visão endoscópica da fossa nasal direita antes da ressecção: seta branca: tumor. Seta preta: septo nasal. (B) Mesma visão após a ressecção endoscópica total: deve‐se observar a integridade da mucosa e do osso. Asterisco branco: parede posterior do seio maxilar direito. Asterisco preto: concha média direita.

(0,3MB).
Figura 3.

Paciente 2 (A), análise histológica mostrando mucosa respiratória pendendo de uma hemorragia antiga e organizada (detalhe) com evidência de reabsorção ativa (siderófagos). A seta indica o epitélio da superfície. (B) Ampliação maior mostrando proliferação endotelial não atípica organizada na forma de uma rede labiríntica e botões papilares. Coloração H&E. Ampliação original: A, 20x; B, 100x.

(0,89MB).
Caso 3

Paciente do sexo feminino de 33 anos apresentou‐se com rinorreia do lado direito havia vários anos, associada a eventual pressão intraorbital ipsilateral e cefaleia. Relatava histórico de carcinoma ductal invasivo com metástases para linfonodos e ossos, tratado com imunoquimioterapia de manutenção. Clinicamente, constatou‐se presença de secreção amarelada no meato médio direito. A ressonância magnética mostrou lesão tumoral heterogênea em seio maxilar direito circundada por mucosa espessada. A TC confirmou o preenchimento subtotal do seio maxilar direito com integridade do osso circundante (fig. 1C). A fim de esclarecer uma possível metástase sinusal, foi indicada a ressecção endoscópica transnasal. A biópsia revelou a presença de uma lesão tumoral escura envolvida por muco sem qualquer infiltração para a mucosa circundante. O seguimento pós‐operatório ocorreu sem intercorrências. A histologia mostrou múltiplas alterações fibrohemorrágicas compatíveis com tumor de Masson, sem malignidade.

Discussão

O tumor de Masson é uma entidade rara que pode ser desconhecida para muitos especialistas. Ele mimetiza uma lesão maligna ao exame clínico, endoscópico, mas especialmente radiológico. Desde sua primeira descrição em 1923, foram relatados casos afetando quase todas as partes do corpo humano, com poucos relatos na área nasossinusal. Na maioria das vezes, os sintomas são inespecíficos e relacionados ao órgão afetado, principalmente com o aparecimento de um nódulo ou sangramento, raramente associado a dor. A avaliação radiológica e as biópsias costumam sugerir malignidade. De acordo com uma das maiores séries relatadas, esse tumor é frequentemente subcutâneo e dérmico, com predileção pelas regiões de cabeça e pescoço, digital e tronco.2 Também foram descritos casos no fígado, na órbita, intramuscular, cavidade oral e intracranianos. Que seja de nosso conhecimento, apenas 10 casos, antes dos relatados aqui, estavam relacionados aos seios paranasais ou cavidade nasal.3‐12 Uma revisão da literatura existente sobre o assunto está resumida na tabela 1. A proporção de homens versus mulheres é de 1,6:1 e a média de idade de apresentação é de 41 ± 16 anos. Os sintomas são os de qualquer doença nasossinusal e não apresentam especificidade.

Tabela 1.

Resumo dos casos publicados de hiperplasia endotelial papilar intravascular nasal

Casos  Sexo/Idade  Localização  Sintomas 
Stevens 1988  M/21  Concha inferior direita  Obstrução nasal, hiposmia, rinorreia, cefaleia frontal 
Stern 1991  M/17  Seio maxilar direito, etmoide e cavidade nasal  Cefaleia frontal, dor no músculo bucinador, exoftalmia 
Safneck 1995  F/36  Concha inferior direita  Obstrução nasal, sensação de plenitude na região do sulco nasolabial 
Lancaster 1998  F/67  Seio maxilar esquerdo e etmoide  Obstrução nasal, rinorreia 
Moon 2000  M/35  Etmoide esquerdo, seio esfenoidal e sela  Diminuição da acuidade visual, ptose, exoftalmia, dores de cabeça fronto‐temporais 
Lombardi 2008  M/26  Etmoide esquerdo e cavidade nasal  Obstrução nasal, secreção purulenta, dor orbital, epífora 
Hooda 2008  F/45  Etmoide direito  Epistaxe 
Wang 2009  M/42  Seio maxilar esquerdo, etmoide, seio frontal e cavidade nasal  Obstrução nasal, rinorreia, epistaxe, cefaleia frontal 
Tuna 2015  M/58  Etmoide esquerdo, esfenoide, seio maxilar, cavidade nasal, coana, fossa pterigopalatina e órbita  Obstrução nasal, epistaxe, exoftalmia 
Al‐Qahtani 2016  F/33  Pansinusal direito  Obstrução nasal, epistaxe, rinorreia, anosmia, cefaleia frontal, exoftalmia 
Presente caso 1  M/46  Seio maxilar esquerdo  Obstrução nasal, rinorreia serosa com sangue 
Presente caso 2  M/76  Seio maxilar direito e cavidade nasal  Epistaxe, rinorreia 
Presente caso 3  F/33  Seio maxilar direito  Rinorreia, pressão orbital, cefaleia 

A correlação clínico‐histológica é importante no tratamento dessa lesão. Em nossa experiência, quanto maior a suspeita clínica, maiores são as chances de coincidir com o diagnóstico histológico adequado. Permanece a suposição de que o tumor de Masson nos seios paranasais seja menos raro do que o relatado, devido à baixa suspeita clínica e à falta de comunicação entre o cirurgião e o patologista. Fenômeno semelhante foi observado recentemente com os hamartomas das fendas olfatórias (REAH, do inglês respiratory epithelial adenomatoid hamartoma),13 para o qual a menção da entidade no diagnóstico diferencial clínico dirigido ao patologista aumenta o número de casos encontrados.

O aspecto endoscópico durante a ressecção também deve levar o cirurgião a solicitar especificamente a pesquisa de hiperplasia endotelial papilar intravascular. Nos três casos aqui apresentados, o aspecto era avascular, sem o acompanhamento esperado de sangramento. A lesão parecia pouco vascularizada e fácil de ressecar. Foi ainda surpreendente para o cirurgião que os tumores não apresentassem um ponto de fixação ou inserção verdadeira e uma mucosa intacta, semelhante ao que se observa na remoção de uma bola fúngica.

Radiologicamente, os três casos apresentavam‐se de forma semelhante, com uma lesão tumoral heterogênea sugerindo malignidade ou pelo menos um processo sólido e tecidual. O diagnóstico diferencial para os três casos foi de um pólipo inflamatório, papiloma invertido, linfoma, adenocarcinoma, carcinoma espinocelular ou metástase. Com base nesses três casos, é difícil estimar até que ponto a radiologia possa suspeitar dessa rara lesão específica. Por outro lado, é evidente que a RM adiciona um valor pré‐operatório nos casos de opacidade unilateral descoberta na TC. Também é impressionante ver a semelhança das três lesões apresentadas na ressonância magnética e dos casos relatados na literatura, a ponto de levantarmos a questão de se o diagnóstico já não poderia ser suspeitado com base na ressonância magnética.

Histologicamente, o tumor de Masson deve ser diferenciado do angiossarcoma.14 A análise histológica mostrou hematoma organizado associado a proliferação endotelial intraluminal não atípica, característica de hiperplasia endotelial papilar intravascular. O diagnóstico correto permitirá um tratamento adequado, que consiste em ressecção completa, evitando assim um tratamento excessivo. Em nossa modesta série, dois pacientes apresentaram quadro oncológico, o que levanta a questão de uma simples coincidência ou de um potencial cofator no desenvolvimento do tumor de Masson. A literatura, com base no pequeno número de casos relatados, não consegue responder a essa questão.

Conclusão

São apresentados três novos casos de hiperplasia endotelial papilar intravascular do seio maxilar. As características endoscópicas, radiológicas e histopatológicas são discutidas. Esses são o 6°, 7° e 8° casos de acometimento do seio maxilar relatados na literatura. Devido à sua apresentação clínica e radiológica, o tumor de Masson é frequentemente confundido com uma doença maligna e apenas a análise histológica pode confirmar o diagnóstico benigno. O tratamento definitivo é a ressecção completa da lesão.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências
[1]
P. Masson.
Hémangioendothéliome végétant intravasculaire.
Bull Soc Anat Paris., 93 (1923), pp. 517-523
[2]
H. Hashimoto, Y. Daimaru, M. Enjoji.
Intravascular papillary endothelial hyperplasia. A clinicopathologic study of 91 cases.
Am J Dermatopathol., 5 (1983), pp. 539-546
[3]
Z.H. Wang, C.H. Hsin, S.Y. Chen, C.Y. Lo, P.W. Cheng.
Sinonasal intravascular papillary endothelial hyperplasia successfully treated by endoscopic excision: a case report and review of the literature.
Auris Nasus Larynx., 36 (2009), pp. 363-366
[4]
D.J. Stevens.
Papillary endothelial hyperplasia in the nose.
J Laryngol Otol., 102 (1988), pp. 935-937
[5]
Y. Stern, D. Braslavsky, K. Segal, Y. Shpitzer, A. Abraham.
Intravascular papillary endothelial hyperplasia in the maxillary sinus. A benign lesion that may be mistaken for angiosarcoma.
Arch Otolaryngol Head Neck Surg., 117 (1991), pp. 1182-1184
[6]
J.R. Safneck, A. Alguacil-Garcia, J.C. Dort.
Intranasal papillary endothelial hyperplasia.
Otolaryngol Head Neck Surg., 113 (1995), pp. 766-770
[7]
J.L. Lancaster, D.J. Alderson, I.W. Sherman, A.H. Clark.
Papillary endothelial hyperplasia (Masson's tumour) of the maxillary sinus.
J Laryngol Otol., 112 (1998), pp. 500-502
[8]
W.S. Moon, G.H. Chung, K.H. Hong.
Intravascular papillary endothelial hyperplasia in a vascular lesion of the paranasal sinus.
Arch Pathol Lab Med., 124 (2000), pp. 1224-1227
[9]
D. Lombardi, C. Galtelli, T. Khrais, M.L. Morassi, P. Nicolai.
Giant hypervascular lesion of the sinonasal tract invading the anterior skull base and orbit: a puzzling case.
Ann Otol Rhinol Laryngol., 117 (2008), pp. 653-658
[10]
S. Hooda, M.R. Humphreys, S.W. Wong, A.S. Evans.
Masson's pseudotumour of the ethmoid sinus ‐ a case report.
J Laryngol Otol., 122 (2008), pp. 990-992
[11]
Tuna EEÜ, B. Türkay, S. Kurukahvecioğlu, Ö. Ataoğlu, A. Eryılmaz.
Sinonasal intravascular papillary endothelial hyperplasia (Masson's tumor).
ENTCase., (2015),
[12]
K.H. Al-Qahtani.
Intravascular papillary endothelial hyperplasia (Masson's tumor) as a nasal mass: a case report and review of the literature.
Pan Arab J Rhinol., 6 (2016), pp. 33-35
[13]
N.B. Lima, R. Jankowski, T. Georgel, B. Grignon, F. Guillemin, J.M. Vignaud.
Respiratory adenomatoid hamartoma must be suspected on CT‐scan enlargement of the olfactory clefts.
Rhinology., 44 (2006), pp. 264-269
[14]
T. Kuo, C.P. Sayers, J. Rosai.
Masson's “vegetant intravascular hemangioendothelioma”: a lesion often mistaken for angiosarcoma: study of seventeen cases located in the skin and soft tissues.

Como citar este artigo: Voruz F, Arnoux G, Serex C‐A, Vito C, Landis BN. Intravascular papillary endothelial hyperplasia (Masson's tumor) of maxillary sinus. Braz J Otorhinolaryngol. 2022;88:141–5.

François Voruz and Charles‐Arnaud Serex are the first two authors.

A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

Copyright © 2020. Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial
Idiomas
Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Announcement Nota importante
Articles submitted as of May 1, 2022, which are accepted for publication will be subject to a fee (Article Publishing Charge, APC) payment by the author or research funder to cover the costs associated with publication. By submitting the manuscript to this journal, the authors agree to these terms. All manuscripts must be submitted in English.. Os artigos submetidos a partir de 1º de maio de 2022, que forem aceitos para publicação estarão sujeitos a uma taxa (Article Publishing Charge, APC) a ser paga pelo autor para cobrir os custos associados à publicação. Ao submeterem o manuscrito a esta revista, os autores concordam com esses termos. Todos os manuscritos devem ser submetidos em inglês.