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Vol. 80. Núm. 3.
Páginas 213-219 (Maio 2014)
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Influência dos corticosteroides no prognóstico auditivo da perda auditiva neurossensorial súbita idiopática
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Eduardo Amaro Bogaza, Flavia A. de Barros Suzukia, Bruno A. Antunes Rossinia, Daniel Paganini Inoueb, Norma de Oliveira Penidob
a Departamento de Otorrinolaringologia, Escola Paulista de Medicina , Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
b Programa de Pós-graduação, Departamento de Otorrinolaringologia, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
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Tabelas (6)
Tabela 1. Médias do PTA inicial e final nas orelhas (dB)
Tabela 2. Médias das taxas de recuperação auditiva na população
Tabela 3. Médias do PTA inicial e final (dB) dentre os diferentes
Tabela 4. testes de aNoVa entre as categorias de tratamento para as taxas de recuperação
Tabela 5. Médias do PTA inicial e final (dB) para
Tabela 6. Testes de ANOVA entre as categorias de “tempo em dias para início de tratamento” e as taxas de recuperação auditiva
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Introduction: Idiopathic Sudden Sensorineural Hearing Loss (ISSHL) is defined when a loss of at least 30 dB occurs in over 3 continuous frequencies, in up to 72 hours, of which etiology is not established, despite adequate investigation. Different types of treatment regimens have been proposed, but only glucocorticoids have shown some evidence of benefit in the literature.

Objective: To analyze whether the type of treatment or time of treatment with glucocorticoids have any influence on hearing recovery in ISSHL.

Methods: Observational retrospective cohort study. One hundred twenty-seven patients with ISSHL, treated at outpatient clinics between the years 2000 and 2010, were studied. We evaluated the prognostic correlation of the type of treatment and time to treatment with glucocorticoids and iSSHL.

Results: The absolute hearing gain and the relative hearing gain was as follows: 23.6 dB and 37.2%. Complete recovery was observed in 15.7% of patients, significant recovery in 27.6% and recovery in 57.5%.

Conclusion: In this study, there was no difference between the use and nonuse of glucocorticoids in hearing improvement. However, when started within seven days after onset, the use of glucocorticoids was a factor of better prognosis.

Keywords:
Hearing loss, sudden; Prognosis; audiometry; Primary treatment

Introdução: A perda auditiva neurossensorial súbita idiopática (PANSSI) é definida pela queda dos limiares auditivos tonais de, pelo menos, 30 dB em três frequências contíguas em até 72 horas e apesar de uma investigação apropriada, a etiologia da lesão não é encontrada. Diversos tipos de tratamentos já foram idealizados para a PANSSI, no entanto, os corticosteroides são os que encontram as melhores evidências de efetividade na literatura.

Objetivo: avaliar se o tipo de tratamento e o tempo de demora em iniciar o tratamento com corticosteroides têm correlação com a melhora dos limiares auditivos na PANSSI.

Métodos: Estudo de coorte retrospectivo observacional. Foram avaliados 127 pacientes com PANSSI provenientes do ambulatório entre os anos de 2000 e 2010. Foi avaliada a correlação prognóstica do tipo de tratamento e tempo de demora para o início de tratamento e a PANSSI.

Resultados: as taxas de recuperação absoluta e relativa foram 23,6 dB e 37,2% respectivamente. Apresentaram melhora completa 15,7% dos pacientes, 27,6% apresentaram melhora significativa e 57,5% melhora.

Conclusão: Neste estudo, não houve diferença entre o uso ou não de corticosteroide na melhora auditiva. Contudo, quando iniciado até sete dias, o uso de corticosteroide foi fator de melhor prognóstico. © 2014 Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.

Palavras-chave:
Perda auditiva súbita; Prognóstico; audiometria; tratamento primário
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Introdução

Para se definir uma perda auditiva como perda auditiva neurossensorial súbita (PANSS), deve ocorrer queda dos limiares auditivos neurossensoriais de, pelo menos, 30 dB em três frequências contíguas em um período variável de poucos minutos até 72 horas.1,2 a incidência da PANSS varia de cinco a 20 indivíduos, em 100.000 pessoas por ano.2

Quando a investigação contempla o diagnóstico etiológico, o caso é classificado como PANSS de causa conhecida e deve receber tratamento específico, como acontece nos schwannomas, doenças degenerativas do sistema nervoso central (esclerose múltipla), sífilis, borreliose e outras. Deve-se sempre buscar uma etiologia e instituir tratamento específico. Os casos de etiologia indeterminada são classificados como perda auditiva neurossensorial súbita idiopática (PANSSI), existindo, nesta situação, algumas teorias para a lesão, tais como: injúria vascular, ruptura de membranas da orelha interna, infecção viral ou bacteriana ele são por anticorpos auto-imunes.3-6

Os corticosteroides sistêmicos têm sido utilizados na prática clínica como principal tratamento da PANSSI, no entanto, há falta de dados consistentes quanto à sua eficácia.1,7,8 a terapia corticosteroide é iniciada o mais precocemente possível, com doses altas da droga por via oral ou parenteral, mantidas por até duas semanas, após o qual é feita retirada escalonada. Diversas outras formas de tratamento já foram ou vêm sendo usadas e estudadas, tais como expansores plasmáticos, carbogênio, antivirais, oxigênio hiperbárico, agentes anti¬oxidantes como minerais e vitaminas, porém com menos evidências estatísticas de eficácia do que o corticosteroide sistêmico.1,8-11

Além de toda a dúvida quanto à eficácia dos corticosteroides na PANSSI, existe recuperação espontânea dos limiares auditivos que pode variar de 32% a 65% dos casos, segundo Mattox et al.12 Estes pacientes, supostamente, não se beneficiariam do uso de altas doses de corticosteroides.

Este estudo teve como objetivo avaliar o impacto do tempo de demora em iniciar o tratamento com corticosteroide e do tipo de tratamento realizado no prognóstico da recuperação auditiva de pacientes com diagnóstico de PANSSI.

Métodos

Os pacientes foram avaliados com base em um estudo observacional de coorte retrospectivo, comindivíduos provenientes do ambulatório de PANSS, atendidos no período de 2000 a 2010, e que apresentaram perda auditiva neurossensorial súbita idiopática.

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética, sob o protocolo CEP 0715/11.

Critérios de inclusão e exclusão

Os pacientes incluídos neste estudo apresentavam PANSSI unilateral de, no mínimo, 30 dB em, pelo menos, três frequências consecutivas, ocorrendo em um período de até 72 horas. Os mesmos fizeram acompanhamento no Ambulatório de PANSS por pelo menos dois meses e até que houvesse estabilização da recuperação auditiva, ou até a normalização auditiva. Foram acompanhados pacientes com diferentes tipos de abordagem terapêutica. O tratamento padrão, quando utilizado, foi prednisona oral na dose de 1 mg/kg/ dia, dose máxima diária de 60 mg, por pelo menos sete dias, seguido de retirada escalonada. Alguns pacientes receberam pentoxifilina na dose de 1200 mg/d em três doses diárias, por dois meses, associado ao corticosteroide ou como único tratamento. Os pacientes que não receberam nenhum tipo de terapia medicamentosa não o fizeram por contra indicação à medicação ou recusa ao tratamento. O tratamento com pentoxifilina foi utilizado nos primeiros anos desse estudo,sendo posteriormente abandonado por falta de evidências quanto à sua eficácia.10

Foram excluídos do estudo pacientes com história pregressa de doenças da orelha média e interna e aqueles cuja etiologia foi definida como trauma, infecção, doença de Ménière, doenças retrococleares, exposição a medicamentos ototóxicos, fístula perilinfática, barotrauma, malformações de orelha média ou interna e história sugestiva de parotidite, dentre outras.

Também foram excluídos os casos bilaterais, pacientes com flutuação auditiva, aqueles que apresentaram perda na orelha contralateral que impossibilitasse o cálculo das taxas de recuperação (perda contralateral mais acentuada que a PANSSI atual), e os que iniciaram o acompanhamento após 90 dias do início da perda auditiva.

Avaliação dos pacientes

Os pacientes que preencheram os critérios de inclusão foram submetidos a uma anamnese criteriosa e exame otorrinolaringológico.

Foram analisados dados clínicos referentes ao quadro: idade; gênero; data de início da hipoacusia; sintomas concomitantes, como zumbido, vertigem, otalgia e plenitude aural; presença de comorbidades, como hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, glaucoma, alterações tireoideas e hábitos; uso de medicamentos; parâmetros audiométricos; episódios pregressos de hipoacusia e antecedentes familiares. As avaliações auditivas dos pacientes foram realizadas no audiômetro Ma 41, calibrado anualmente por empresa competente e fabricado pela empresa DBa Maico Diagnostics, Minnesota, EUA. Foram obtidos os limiares audiométricos iniciais, o que coincidiu com o início do tratamento/acompanhamento, e finais, sendo estes últimos obtidos após, pelo menos, dois meses da audiometria inicial e com melhora auditiva já estabilizada, ou antes, em caso de normalização dos limiares.

Os pacientes foram ainda submetidos a exames laboratoriais que incluíram hemograma, dosagem para lípides, glicemia sérica de jejum, função renal e tireoidiana e velocidade de hemossedimentação. Foram realizados, ainda, exames sorológicos para sífilis, SIDA, borreliose, quando julgado necessário. Em casos suspeitos, foi realizada pesquisa para doenças auto-imunes. Realizaram ressonância nuclear magnética de vias auditivas periféricas e centrais 87 pacientes.

Cálculo da média das frequências acometidas

Foram obtidas as médias aritméticas dos tons puros (PTA), no início e no final do acompanhamento, em todos os pacientes, utilizando o seguinte método: médias aritméticas dos tons puros de cada paciente, de acordo com o grupo de frequências acometidas. Quando foram atingidas frequências graves e médias, foi obtida a média aritmética das frequências de 0,25; 0,5;1 e 2 kHz; quando médias e agudas, a média das frequências de 1; 2; 3; 4; 6 e 8 kHz; quando somente agudas, a média de 3; 4; 6 e 8 kHz; quando graves, médias e agudas, a média de todas as oito frequências. Foi também calculado o PTA por média das frequências acometidas na orelha contralateral de cada paciente, de acordo com o grupo de frequências da orelha acometida. Quando não foram detectados os limiares auditivos de perdas profundas, foi considerado como resposta o limite máximo do audiômetro, no caso 120 dB.

Cálculo das taxas de recuperação

Para obtenção das taxas de recuperação auditiva absoluta e relativa, levou-se em consideração o lado não -acometido, conforme as fórmulas a seguir:

Taxa de recuperação absoluta do PTA (dBNa): (PTA inicial orelha acometida _ PTA inicial orelha não acometida) _ (PTA final orelha acometida _ PTA final da orelha não acometida)

Taxa de recuperação relativa do PTA (%):

(PTA inicial orelha acometida _ PTA inicial orelha não acometida) _ (PTA final orelha acometida _ PTA final da orelha não acometida) × 100 / (PTA inicial orelha acometida _PTA inicial da orelha não acometida)

Critérios de melhora auditiva pela audiometria tonal

Para análise da melhora auditiva, foi considerado o incremento na média aritmética de tons puros (PTAfinal- PTAinicial), e a mudança de categoria funcional, tendo sido consideradas:

Audição normal e perdas leve, moderada, severa e profunda.

Melhora: mudança de categoria funcional e melhora ≥ 15 dB. Melhora significativa: quando houve melhora e a perda auditiva final ficou leve.

Melhora completa: quando houve melhora e os limiares auditivos voltaram ao normal. (≤ 25dB).

Avaliação do tratamento

Os seguintes fatores foram avaliados no tratamento, com base nas taxas de recuperação auditiva e graus de melhora.

1. Tipo de tratamento realizado:

Como tipo de tratamento realizado, os pacientes foram categorizados de acordo com a droga utilizada em seu tratamento: só corticosteroide; corticosteroide + pentoxifilina; só pentoxifilina e sem tratamento.

2. Tempo em dias para o início do tratamento:

Como tempo para início do tratamento, foram considerados os dias para início do corticosteroide, categorizado como: até dois dias; de três a sete dias; de oito a dez dias; acima de dez dias; e sem tratamento. Pacientes que usaram apenas pentoxifilina foram alocados no grupo sem tratamento.

Não houve randomização para alocação dos pacientes nas diferentes categorias de tratamento; isto ocorreu por indicações clínicas, assim como contraindicações, recusa do paciente, impossibilidade de tratamento e outras. Não houve pareamento por idade, gênero, presença de comorbidades, parâmetros audiométricos e outros possíveis fatores prognósticos na categorização dos grupos.

Metodologia estatística: foram utilizados os testes Quiquadrado, indicado para verificar diferenças na distribuição de uma característica categorizada (duas ou mais categorias) em função de outra também categorizada, e aNoVa para comparar três ou mais grupos de informação com mensuração numérica, com nível de significância estatística p < 0,05.

Resultados

Foram avaliados 277 pacientes com perda auditiva neurossensorial súbita pelo ambulatório de PANSS, no período de 2000 a 2010. Destes, oito pacientes não preencheram o critério de definição de PANSS. Em dez pacientes houve perdas bilaterais, e em 33 (12%) foi encontrada a etiologia da perda auditiva. Perderam seguimento 75 pacientes, e não foi obtido o Termo de Consentimento para uso de informações do tratamento para 24 deles. Foram incluídos no estudo 127 pacientes, os quais preencheram os critérios de inclusão para PANSSI unilateral. A idade mínima da população foi 12 anos, e a máxima 82, com média de 48 anos. Dos pacientes, 64 eram do gênero feminino e 63 do masculino. O lado direito foi acometido em 46,5% dos casos, e o esquerdo em 53,5%. Tabagismo foi registrado em 11% dos casos, hipertensão arterial em 34,6%, diabetes em 15% e dislipidemia em 11%. Estavam presentes nos antecedentes pessoais dos casos: cardiopatia em 9,4%; acidente vascular encefálico em 2,4%; hipotireoidismo em 6,3%; e insuficiência renal em 3,1%. O zumbido foi o sintoma associado mais frequente em 92,1% dos casos. Foram constatadas a vertigem em 52,8% dos casos e plenitude aural em 43,3%. Realizaram ressonância magnética 87 pacientes.

As médias do PTA inicial e final e as taxas de recuperação auditiva, na amostra, seguem nas tabelas 1 e 2.

De acordo com os critérios adotados, houve melhora em 57,5 %, melhora significativa em 27,6 %, e melhora completa em 15,7 %.

1. Tipo de tratamento realizado

Foi analisada a redução do PTA e as taxas de recuperação, levando-se em consideração o tipo de tratamento (tabelas 3 e 4).

Não houve diferença estatisticamente significativa para redução do PTA e das taxas de recuperação nos diferentes grupos. No entanto, há indícios estatísticos de que os grupos que utilizaram corticosteroides tiveram menor PTA final e maiores taxas de recuperação.

2. Tempo em dias para o início do tratamento

Observou-se que o PTA inicial foi estatisticamente semelhante nas diferentes faixas de dias para início do tratamento. Quanto à redução absoluta do PTA, não houve diferença estatística nos três grupos que iniciaram tratamento em até dez dias. Houve menores reduções no PTA para aqueles que iniciaram tratamentoacima de dez dias ou que não tiveram tratamento. Para a taxa de recuperação auditiva absoluta, casos sem tratamento tiveram melhora inferior àqueles que iniciaram tratamento em até sete dias. Para a taxa de recuperação auditiva relativa, os pacientes que iniciaram tratamento em até sete dias tiveram maior recuperação que os que não trataram ou iniciaram tratamento após sete dias, com significância estatística. Pacientes que iniciaram tratamento antes de sete dias apresentaram redução do PTA com alto índice de significância (p < 0,0001), (tabelas 5 e 6).

Discussão

Continua sendo um desafio, até hoje, a interpretação e comparação dos estudos acerca do tratamento e fatores de prognóstico na PANSSI, pois a maioria deles adota metodologias e critérios diferentes de avaliação da recuperação auditiva. Alguns estudos avaliam o PTA a partirde três (0,5;1; 2 kHz),12 quatro (0,5; 1; 2; 4 kHz)13 e seis frequências (0,25; 0,5; 1; 2; 4; 8 kHz),14 e outros com a média de todas as frequências. Há análises que avaliam apenas a média das frequências acometidas pela perda auditiva.15 Em estudo previamenterealizado, no qual foram analisadas as diferentes metodologias empregadas na avaliação da PANSSI, inoue et al. Identificaram que, ao se utilizar as médias de seisfrequências (0,25; 0,5; 1; 2; 4; 8 kHz), oito frequências (0,25; 0,5; 1; 2; 3; 4; 6; 8 kHz) e frequências acometidas, o mesmo poder de avaliação é obtido, sem diferenças estatísticas entre as essas médias.16 No entanto, nesta mesma análise, não foram comparadas as médias de três e quatro frequências, utilizadas em vários estudos no passado, em que são focalizadas as frequências graves e médias. A opção, neste estudo, foi pelo emprego do cálculo do PTA por frequências acometidas, pois acreditamos ser mais representativo individualmente, já que evita que se deixe de fora do cálculo frequências acometidas e, também, que sejam incluídas outras frequências não acometidas, subestimando assim o grau de perda traduzido pela média.

No mesmo estudo de inoue et al., foram avaliados os diversos critérios de melhora utilizados na literatura. Observou-se que critérios que consideram uma melhora significativa como aquela que leva o paciente a uma perda auditiva final ao menos leve pode traduzir com mais fidelidade, o que é um incremento importante da audição para o indivíduo. Isso porque, com uma perda auditiva leve, muitas vezes consegue-se uma adaptação natural a esta nova condição, com menor chance de necessidade do uso de amplificadores sonoros individuais ou outros tipos de próteses auditivas. Por estas razões, optamos pela utilização dos mesmos critérios de melhora que inoue et al. neste estudo, que foram descritos em seção anterior.

Optou-se, ainda, pela avaliação do tempo de espera para o início de tratamento com corticosteroide como fator prognóstico, e do uso ou não do corticosteroide como tratamento, já que esta é a principal e mais difundida forma terapêutica utilizada na atualidade para PANSSI, mas que ainda existem dúvidas em relação àsua eficácia.

A média das taxas de recuperação absoluta e relativa nesta amostra foram, respectivamente, 23,7 dB e 37,2%. Apresentaram algum tipo de melhora 57,5%, e apenas 27,6% apresentaram melhora significativa, ou seja, ao final do acompanhamento havia uma perda auditiva no máximo leve ou audição normal (melhora completa = 15,7%). Cvorovic et al., em 2008, estudaram 541 pacientes com PANSS e encontraram taxas de recuperação semelhantes, de 15,1 dB e 47%.17 No entanto, sua taxa de pacientes com melhora significativa (PTA final < 40 dB) foi de 57%. Xenellis et al.,em 2006, encontraram taxas de recuperação completa em 37,7% dos casos.18 Neste estudo, a taxa de recuperação absoluta na população pesquisada foi de 24,3 dB e o PTA final médio da população foi de 47,7 dB, enquanto que na nesta amostra o PTA final médio foi de 59,2 dB.

Analisando as taxas de recuperação dos pacientes estudados e sem levar em conta o tempo para o início do tratamento, foi constatado que pacientes tratados com corticosteroide não apresentaram uma recuperação estatisticamente significante melhor que qualquer outro tratamento, embora a análise mostre uma tendência de que seja melhor. Wei et al. Realizaram uma revisão de ensaios clínicos e concluíram que não há evidências suficientes para confirmar ou descartar a eficácia do uso de corticosteroides na PANSSI.19 outros estudos, incluindo ensaios clínicos prospectivos, randomizados e duplo cegos, sugerem o benefício da terapia corticosteroide para PANSS.1,20-24 os corticosteroides são drogas com potente ação anti-inflamatória, e até imunossupressora, atuando em fase precoce da cascata inflamatória. A PANSSI acontece por uma lesão ao sistema auditivo, cuja causa é ainda desconhecida. Várias teorias existem para explicar tal lesão: infecção viral, ruptura de membranas da orelha interna, agressão vascular, ataque auto-imune ao vestíbulo e outras,3-6 e todas têm envolvida em sua fisiopatogenia a agressão inflamatória. Diversos tipos de tratamento já foram idealizados, sendo o uso de corticosteroides por via sistêmica o mais consagrado, já que trataria o processo inflamatório, que é a via final de agressão em todos esses mecanismos fisiopatogênicos. Em 2007, na meta-análise realizada por Colinset al., que incluiu cinco ensaios clínicos randomizados, não foram encontradas evidências de que o corticosteroide tenha melhor desempenho do que o placebo ou outros tipos de terapias na PANSSI. No entanto, a corticoterapia sistêmica, ou intratimpânica, é a única terapia que mantém recomendação no último consenso da academia americana de otorrinolaringologia em PANSSI.8 a análise desta amostra indica que os diferentes tipos de tratamento, sem considerar o tempo de demora para o seu início, não apresentaram diferença estatística quanto ao grau de melhora. No entanto, os grupos que utilizaram corticosteroides foram os únicos que mostraram uma tendência estatística de maior recuperação, quando comparados aos que efetivamente não tiveram nenhum tratamento. Pacientes que usaram pentoxifilina foram alocados em grupos de tratamento de acordo com o uso ou não de corticosteroide, sendo, portanto, avaliados, mas tendo sido desconsiderado seu uso como tratamento efetivo. Probst et al., em estudo prospectivo, randomizado e duplo cego, avaliaram 331 casos de PANSSI e trauma acústico tratados em três grupos com infusões de pentoxifilina, dextran e solução salina, e não encontraram diferença estatística na melhora entre os grupos destes medicamentos e o grupo placebo.

Nesta amostra, como em outros estudos, houve uma boa correlação entre o tempo de demora para o início de tratamento e o prognóstico, fato evidenciado pelas análises estatísticas.17,18,20,25-29 o tempo para o início do tratamento levou em consideração os dias de demora para o início do corticosteroide, que, na quase totalidade, coincidiu com o dia de inclusão do paciente em nosso protocolo e audiometria inicial. Foi observado que o PTA no início do acompanhamento foi estatisticamente semelhante nas diferentes faixas de dias para o início do tratamento, demonstrando que o grau de perda auditiva inicial foi semelhante nos diferentes grupos. Não houve diferença estatística na redução do PTA nos três grupos que iniciaram tratamento em até dez dias. Porém, houve menores reduções no PTA para aqueles que iniciaram tratamento com mais de dez dias ou que não tiveram tratamento. Pacientes que iniciaram tratamento antes de sete dias apresentaram redução do PTA com alto índice de significância (p < 0,0001). Além disso, observa-se claramente que os pacientes que iniciaram tratamento antes de sete dias apresentaram melhores taxas de recuperação absoluta e relativa, quando comparados àqueles que iniciaram tratamento nas categorias acima de sete e dez dias. Tal fato poderia ter influenciado na falta de significância estatística ocorrida quando foram comparados os tipos de tratamento, já que nesta análise os pacientes que utilizaram corticosteroide foram alocados em um grupo em que não se levou em consideração o tempo de demora para o início do tratamento. Não houve diferença estatística nas taxas de recuperação em pacientes que iniciaram o tratamento com corticosteroide antes de 48 horas ou em até sete dias, indicando que o uso do medicamento tem a mesma eficácia se iniciado em até sete dias. Huy et al. não encontraram benefício no início precoce do tratamento, comparando indivíduos que iniciaram corticosteroide em até dois dias ou entre três e sete dias. O mesmo estudo, no entanto, não avaliou qualquer paciente que tenha iniciado tratamento com corticosteroide após sete dias. Poucas análises não encontraram correlação entre tempo de início de tratamento e prognóstico.13,30

Apesar de os dados de análise estatística apontarem para uma influência significativa do tempo de espera para o início de tratamento com corticosteroide como um fator significativo na análise prognóstica destes pacientes, há uma ressalva que não se pode ignorar. Segundo Mattox et al., de um a dois terços dos pacientes acometidos por PANSS apresentam melhora espontânea sem qualquer tratamento, número que se aproxima da nossa taxa de melhora de 57,5%. Considerando que pacientes que iniciaram tratamento e que, neste caso, realizaram sua audiometria inicial após dez dias de evolução, isso pode nos levar a pensar que estes já passaram por um período significativo em que já houve melhora parcial dos limiares audiométricos, e que, portanto, seupotencial de melhora torna-se menor, o que prejudica a análise da real influência do corticosteroide nesta categoria. Tal fato é corroborado pelo estudo de ito et al., que avaliou 90 pacientes com PANSSI, em que o grupo que apresentou melhora de mais de 50% dos limiares auditivos nas primeiras duas semanas de evolução apresentaram melhor recuperação auditiva final.31 isto mostra que boa parte dos pacientes tem uma recuperação significativa dos limiares na primeira e segunda semanas, fazendo com que aqueles tratados após dez dias, e que já evoluíram com alguma recuperação, tenham um potencial de ganho auditivo menor que aqueles avaliados no início do quadro, ou,ainda, que os que ainda não apresentaram recuperação significativa dos limiares não o façam com tanto sucesso. Além disso, pacientes que iniciam tratamento e avaliação nos primeiros dias de quadro podem estar melhorando não necessariamente pelo tratamento em si, já que as taxas de recuperação espontâneas, como dito, se aproximam daquelas de melhora de pacientes tratados.

Enquanto não for possível detectar a origem específica para cada indivíduo com PANSSI, possivelmente esses pacientes terão etiologias distintas, e esse fator com certeza comprometerá a análise e a comparação final da recuperação auditiva desses indivíduos. Existem ainda muitas dúvidas em relação à patogênese da PANSSI que precisam ser esclarecidas cientificamente.

Conclusão

Neste estudo, de uma forma geral, não houve melhora estatisticamente significante nas taxas de recuperação auditiva entre indivíduos com perda auditiva neurossensorialsúbita idiopática tratada ou não com corticosteroide. Contudo, quando esta modalidade de tratamento foi instituída em até sete dias do início do quadro, o uso do corticosteroide foi melhor em relação à recuperação dos limiares auditivos.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.


Recebido em 26 de fevereiro de 2013;

aceito em 1 de fevereiro de 2014

Doi se refere ao artigo: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.02.002

Como citar este artigo: Bogaz EA, Suzuki FAB, Rossini BAA, Inoue DP, Penido NO. Glucocorticoid influence on prognosis of idiopathic sudden sensorineural hearing loss. Braz J Otorhinolaryngol. 2014;80:213-9.

* Autor para correspondência.

E-mail: eabogaz@uol.com.br (E.A. Bogaz).

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Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
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