Compartilhar
Informação da revista
Vol. 84. Núm. 5.
Páginas 560-565 (Setembro - Outubro 2018)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
5194
Vol. 84. Núm. 5.
Páginas 560-565 (Setembro - Outubro 2018)
Artigo original
Open Access
Is there a best side for cochlear implants in post‐lingual patients?
Existe um lado melhor para implantes cocleares em pacientes pós‐linguais?
Visitas
5194
Maria Stella Arantes do Amarala, Thiago A. Damicoa, Alina S. Gonçalesb, Ana C.M.B. Reisc, Myriam de Lima Isaacc, Eduardo T. Massudac, Miguel Angelo Hyppolitoc,
Autor para correspondência
mahyppo@fmrp.usp.br

Autor para correspondência.
a Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia, Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Ribeirão Preto, SP, Brasil
b Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), Hospital das Clínicas, Setor de Fonoaudiologia, Ribeirão Preto, SP, Brasil
c Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Ribeirão Preto, SP, Brasil
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Tabelas (5)
Tabela 1. Comparação da média dos limiares auditivos (dBNA) em 500Hz nos grupos estudados
Tabela 2. Resultados audiológicos do melhor lado de resíduo auditivo (Grupo A), de acordo com o tempo de privação sonora (valor p – teste de Mann‐Whitney)
Tabela 3. Resultados audiológicos do pior lado de resíduo auditivo (Grupo B), de acordo com o tempo de privação sonora (valor p – teste de Mann‐Whitney)
Tabela 4. Resultados audiológicos do pior lado de audição residual, de acordo com a comparação entre a média das frequências e tempo de privação sonora (Grupo B) (valor p – Teste de Mann‐Whitney)
Tabela 5. Resultados audiológicos do melhor lado de audição residual, de acordo com a comparação entre a média das frequências e tempo de privação sonora (Grupo A) (valor p – Teste de Mann‐Whitney)
Mostrar maisMostrar menos
Abstract
Introduction

Cochlear Implant is a sensory prosthesis capable of restoring hearing in patients with severe or profound bilateral sensorineural hearing loss.

Objective

To evaluate if there is a better side to be implanted in post‐lingual patients.

Methods

Retrospective longitudinal study. Participants were 40 subjects, of both sex, mean age of 47 years, with post‐lingual hearing loss, users of unilateral cochlear implant for more than 12 months and less than 24 months, with asymmetric auditor reserve between the ears (difference of 10dBNA, In at least one of the frequencies with a response, between the ears), divided into two groups. Group A was composed of individuals with cochlear implant in the ear with better auditory reserve and Group B with auditory reserve lower in relation to the contralateral side.

Results

There was no statistical difference for the tonal auditory threshold before and after cochlear implant. A better speech perception in pre‐cochlear implant tests was present in B (20%), but the final results are similar in both groups.

Conclusion

The cochlear implant in the ear with the worst auditory residue favors a bimodal hearing, which would allow the binaural summation, without compromising the improvement of the audiometric threshold and the speech perception.

Keywords:
Cochlear implant
Hearing
Speech perception
Sound deprivation
Auditory residue
Resumo
Introdução

O implante coclear é uma prótese sensorial capaz de restaurar a audição em pacientes com perda auditiva neurossensorial bilateral severa ou profunda.

Objetivo

Avaliar se há um melhor lado para o implante coclear em pacientes pós‐linguais.

Método

Estudo longitudinal retrospectivo; incluiu 40 indivíduos, de ambos os sexos, média de 47 anos, com perda auditiva pós‐lingual, usuários de implante coclear unilateral por mais de 12 meses e menos de 24 meses, com perda auditiva assimétrica entre as orelhas (diferença de 10 dBNA, em pelo menos uma das frequências), divididos em dois grupos. O Grupo A foi composto por indivíduos com implante coclear na orelha com melhor audição residual e Grupo B com menor audição residual em relação ao lado contralateral.

Resultados

Não houve diferença estatística entre o limiar auditivo tonal antes e depois do implante coclear. Uma melhor percepção da fala nos testes pré‐implante coclear foi observada no grupo B (20%), mas os resultados finais foram semelhantes em ambos os grupos.

Conclusão

O implante coclear na orelha com pior audição residual favorece uma audição bimodal, o que possibilitaria a somação binaural, sem comprometer a melhora do limiar audiométrico e a percepção da fala.

Palavras‐chave:
Implante coclear
Audição
Percepção da fala
Privação de som
Resíduo auditivo
Texto Completo
Introdução

O Implante coclear (IC) é uma prótese auditiva eletrônica sensorial capaz de restabelecer a audição em pacientes com perda auditiva severa a profunda bilateral, quando o uso do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) já não é mais eficaz. Suas indicações têm sido expandidas para outros tipos de perdas, dados os avanços tecnológicos relacionados a programas, aparelhos e eletrodos, e, ao processo dereabilitação.

Para a indicação do IC é necessária uma avaliação multidisciplinar, incluindo avaliações médica, psicológica, social e fonoaudiológica. São necessários exames audiológicos e também exames de imagem, que auxiliam no diagnóstico etiológico, na programação do procedimento cirúrgico e na previsão das respostas auditivas após ativação do processador de fala.1

Este dispositivo eletrônico pode ser indicado para crianças com disacusia sensorioneural severa a profunda bilateral que ainda não adquiriram a linguagem oral (pré linguais), ou para adultos e crianças com este tipo de disacusia e que já adquiriram a linguagem oral, ou seja, perderam a audição após adquirirem a linguagem oral (pós linguais).2

Nos indivíduos com surdez pós lingual, existem aqueles que possuem audiometria com curvas assimétricas pois escutam melhor em uma das orelhas em relação à outra e/ou receberam estímulo sonoro auditivo assimétrico (maior em uma das orelhas). Nestes casos, após análise de imagens de tomografia computadorizada (TC) e Ressonância Nuclear Magnética (RNM) da orelha interna, quando não existe a indicação da melhor orelha por apresentar melhores condições anatômicas, faz‐se necessário escolher o lado a ser implantado cirurgicamente o dispositivo eletrônico de forma a obter o melhor resultado audiológico, otimizando o benefício com o implante coclear.3

Alguns autores indicam a implantação do dispositivo interno do IC no lado da melhor “reserva auditiva”, concordando com estudos de ossos temporais humanos que revelam maior número de neurônios no gânglio espiral em orelhas com melhor audição residual, o que indicaria maior possibilidade de sucesso cirúrgico.4–6 Apesar destas considerações, a maioria dos pacientes, por insegurança dos resultados, ou pela impossibilidade da implantação bilateral, por livre escolha, opta pela cirurgia do IC na orelha com pior resultado auditivo.

Apesar da maior possibilidade de sucesso cirúrgico com a escolha do lado com melhor reserva auditiva, sabe‐se que o IC unilateral proporciona a audição monoaural, sem possibilidade de estímulo por meio de aparelho auditivo do outro lado, limitando a localização e discriminação de sons em ambientes ruidosos.7

Pensando em proporcionar ao paciente uma possibilidade de audição binaural, (nas duas orelhas) de forma bimodal com o IC em uma orelha e o aparelho de amplificação sonora convencional na outra, conforme recomendação do Consenso Internacional sobre implantes cocleares em 2005, alguns cirurgiões, têm optado pela escolha do lado de pior reserva auditiva para a implantação do dispositivo interno do IC, na tentativa de proporcionar uma audição com somação binaural.8‐10

A audição binaural elimina o efeito sombra da cabeça, que ocorre pela obstrução da cabeça à chegada do estímulo sonoro, quando este é apresentado a apenas uma orelha, proporciona o efeito squelch, que é a habilidade do sistema auditivo em utilizar a informação de ambas as orelhas quando a fala e o ruído são separados espacialmente e proporciona a somação binaural como resultado do processamento auditivo central em integrar e utilizar a audição das duas orelhas. 11

O objetivo deste estudo foi avaliar se existe um melhor lado a ser implantado em pacientes pós linguais, ou seja, verificar se o IC do lado da pior reserva coclear e pior resíduo auditivo traz resultados audiológicos semelhantes aos pacientes que tiveram sua melhor orelha implantada.

Método

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética sob o número 56931916.8.0000.5440.

Foi realizado um estudo retrospectivo longitudinal por meio de revisão de prontuários médicos de pacientes pós linguais submetidos à cirurgia de Implante Coclear no período entre 2004 e 2014 a fim de avaliar a melhor resposta audiológica. Foram analisadas as variáveis referentes à idade no momento da implantação, sexo, tempo de perda auditiva, tempo de privação auditiva e as características audiológicas de cada paciente no pré e pós IC. Para a obtenção dos resultados pós implante coclear, foram padronizados os resultados audiológicos no período entre 1 e 2 anos pós implante coclear.

Foram incluídos os pacientes usuários de implante coclear unilateral com no mínimo 1 ano completo de utilização do processador de fala, perda auditiva severa a profunda pós lingual assimétrica e idade maior igual a 18 anos. Foram excluídos os usuários de implante coclear bilateral, pacientes com perda auditiva severa a profunda pré‐lingual, idade menor que 18 anos, com alteração de desenvolvimento neuropsicomotor ou com etiologia de meningite.

Os pacientes foram divididos em dois Grupos (A e B) de acordo com o lado implantado, ou seja, Grupo A com pacientes implantados no lado com maior resíduo auditivo e Grupo B com pacientes implantados no lado com o pior resíduo auditivo. Ambos os grupos foram subdivididos para análise de acordo com o tempo de privação de audição, com tempo de privação abaixo ou igual a 10 anos e com tempo de privação de audição acima de 10 anos. O critério do tempo de privação auditiva para dividir os grupos foi baseado em relatos obtidos na literatura.12,13

A amostra foi dividida em dois grupos, grupo A constituído pelos pacientes implantados no lado considerado como tendo a melhor reserva auditiva, limiares de audiometria tonal limiar em 500 Hz maiores ou iguais a 10 dBNA em relação ao lado contralateral e que referiam melhor audição deste lado. No grupo B foram incluídos os pacientes implantados no pior lado, ou seja, limiares de audiometria tonal limiar em 500 Hz menor do que 10 dBNA em relação ao lado contralateral, referindo pior audição neste lado.

Os dados foram comparados através do teste estatístico de Mann‐Whitney não paramétrico, em amostras independentes (entre grupos) e através do Teste da Soma dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, em amostras pareadas (pré vs. pós), pois os dados não seguiam a distribuição normal. Para as análises estatísticas foi utilizado o software JMP SAS, versão 10.0 (SAS Institute Inc., Cary, NC, EUA).

Resultados

O Grupo A, constituído de pacientes implantados na melhor orelha, foi composto por 19 pacientes com idade média de 49 anos (48,6 ± 15,3), nove homens e dez mulheres. O Grupo B, foi constituído de pacientes implantados no pior lado quanto à audição, composto por 21 pacientes, com idade média de 45 anos (45,4 ± 15,1), seis homens e 15 mulheres. Não houve diferença entre os grupos quanto ao sexo (p = 0,2201‐ Teste Qui Quadrado) e idade (p = 0,504 ‐ Teste t de Student).

O tempo de perda de audição não diferiu entre os Grupos A (20,1 ± 11,6 anos) e B (22,1 ± 12,4 anos) (p = 0,601). O mesmo ocorreu com o tempo de privação sonora, Grupo A (10,5 ± 10,2 anos) e Grupo B (10,7 ± 14,0 anos) (p = 0,589, teste de Mann‐Whitney).

A tabela 1 mostra o limiar médio de audiometria em 500Hz nos grupos pré e pós‐IC. A variável “ganho” é a diferença entre os dois períodos de tempo.

Tabela 1.

Comparação da média dos limiares auditivos (dBNA) em 500Hz nos grupos estudados

Grupo  Pré  Pós  Ganho  Valor p 
A – Melhor  104,2 ± 11,2  33,2 ± 8,0  71,1 ± 16,7  < 0,0001b 
B – Pior  106,4 ± 12,2  31,2 ± 10,0  75,2 ± 16,0  < 0,0001b 
valores p  0,468a  0,492a  0,505a   
a

Comparação entre grupos, teste de Mann‐Whitney.

b

Comparação entre pré‐ e pós‐IC – Teste da Soma dos Postos Sinalizados de Wilcoxon.

Houve um aumento significativo nos limiares de audição após IC para os Grupos A e B, mas quando os grupos foram comparados não houve diferença significativa na audiometria tonal pura a 500Hz antes e após IC ou ganho audiométrico entre os dois grupos (p = 0,468, p = 0,492 e p = 0,505).

Ao analisar o nível médio de audição (medido em 500, 1000, 2000, 3000 e 4000Hz) antes e após IC, não houve diferença estatística entre os Grupos A e B (p = 0,321 e p = 0,635, teste de Mann‐Whitney) e sem diferença no ganho audiológico entre os dois grupos (p = 0,455). Para cada grupo individual, o ganho antes e após a cirurgia de IC foi significativo (p < 0,0001 para os Grupos A e B, teste de Wilcoxon).

Em relação aos testes de percepção de fala pré‐IC, observou‐se uma melhor porcentagem no Grupo B antes da cirurgia de IC, mas não houve diferença significativa em ambos os grupos (p = 0,069, teste de Mann‐Whitney). Após um ano de uso do processador de fala, não houve diferença significativa em ambos os grupos (p = 0,974). Quanto a cada grupo individual, observou‐se diferença estatística na situação pré e pós‐IC (p = 0,0005, Grupo A) e (p < 0,0001, Grupo B, teste de Wilcoxon).

A 500Hz no Grupo A (melhor lado), não houve diferença entre o tempo de privação abaixo ou igual a 10 anos ou superior a 10 anos no pré e pós‐IC (p = 0,7525 e p = 0,2962), o que também foi observado nos testes de percepção de fala antes e após IC (p = 0,0585 e p = 0,2051). Observamos diferença estatística no ganho de percepção da fala na comparação do tempo de privação sonora (p = 0,0125) (tabela 2).

Tabela 2.

Resultados audiológicos do melhor lado de resíduo auditivo (Grupo A), de acordo com o tempo de privação sonora (valor p – teste de Mann‐Whitney)

Tempo de privação sonora do melhor lado implantando  Pacientes com tempo de privação sonora menor do que ou igual a 10 anos  Pacientes com tempo de privação sonora maior do que 10 anos  Valor p (comparação entre os dois tempos de privação sonora) 
Média a 500 Hz Pré‐IC  106 dB  102,22 dB  0,7525 
Média a Hz Pós‐IC  34,4 dB  31,66 dB  0,2962 
Ganho a 500 Hz  71,6 dB  70,56 dB  0,7543 
Teste de Percepção da Fala – Pré‐IC – palavras trissílabas  0%  16%  0,0585
 
Teste de Percepção da Fala – Pós‐IC – palavras trissílabas  91,11%  77,71%  0,2051 
Ganho de fala  91,11%  61,71%  0,0125 

Apesar da privação sonora no Grupo B, não foi encontrada diferença entre pacientes com 10 anos ou menos e mais de 10 anos a 500Hz para pré e pós‐IC (p = 0,1339 e p = 0,0784) e nos testes de percepção da fala pré‐IC (p = 0,2038) ou ganho de percepção da fala (p = 1,0000) (tabela 3). Quando os testes de percepção de fala e o tempo de privação sonora foram comparados, diferença estatística foi encontrada (p = 0,0130) (tabela 3).

Tabela 3.

Resultados audiológicos do pior lado de resíduo auditivo (Grupo B), de acordo com o tempo de privação sonora (valor p – teste de Mann‐Whitney)

Tempo de privação sonora no lado pior para implante  Pacientes com tempo de privação sonora menor do que ou igual a 10 anos  Pacientes com tempo de privação sonora maior do que 10 anos  Valor p (comparação entre os dois tempos de privação sonora) 
Média a 500 Hz Pré‐IC  104,23 dB  110 dB  0,1393 
Média a 500 Hz Pós‐IC  28,07 dB  36,25 dB  0,0784 
Ganho a 500 Hz  76,16 dB  73,75 dB  0,7708 
Teste de Percepção da Fala – Pré‐IC – palavras trissílabas  25%  9%  0,2038 
Teste de Percepção da Fala – Pós‐IC – palavras trissílabas  90%  70,85%  0,0130 
Ganho de fala  65%  61,85%  1,0000 

A média de frequência para 500, 1000, 2000, 3000 e 4000Hz em relação ao tempo diferente de privação sonora pós‐IC para o Grupo B mostrou diferença estatisticamente significativa (p = 0,0352) (tabela 4), que não ocorreu ao Grupo A (p = 0,4751) (tabela 5).

Tabela 4.

Resultados audiológicos do pior lado de audição residual, de acordo com a comparação entre a média das frequências e tempo de privação sonora (Grupo B) (valor p – Teste de Mann‐Whitney)

Tempo de privação sonora do pior lado implantado  Menos do que ou igual a 10 anos  Mais de 10 anos  Valor p (comparação entre os dois tempos de privação da audição) 
Média dos limiares auditivos para as frequências de 500–4000 Hz, Pré‐IC, em dB  111,38  111,38  0,1768 
Média dos limiares auditivos para as frequências de 500–4000 Hz, Pós‐IC, em dB  28,15  35,5  0,0352 
Ganho médio  82,23  75,88  0,5137 
Tabela 5.

Resultados audiológicos do melhor lado de audição residual, de acordo com a comparação entre a média das frequências e tempo de privação sonora (Grupo A) (valor p – Teste de Mann‐Whitney)

Tempo de privação sonora do melhor lado implantado  Menos do que ou igual a 10 anos  Mais de 10 anos  Valor p (comparação entre os dois tempos de privação da audição) 
Média dos limiares auditivos para as frequências de 500–4000 Hz, Pré‐IC, em dB  112,91  108,88  0,4738 
Média dos limiares auditivos para as frequências de 500–4000 Hz, Pós‐IC, em dB  32,73  30,63  0,4751 
Ganho médio  80,18  78,25  0,8237 
Discussão

O dispositivo eletrônico do Implante Coclear é a prótese sensorial mais efetiva na história da medicina. As indicações de IC passaram por evolução e dependeram do desenvolvimento tecnológico, da melhoria das técnicas cirúrgicas e do treinamento e da qualificação de equipes interdisciplinares envolvidas em todas as etapas do processo de implante, o que permitiu que essa tecnologia beneficiasse pessoas com diferentes graus de perda de audição com diferentes tempos de privação auditiva.11

Ao comparar Grupos A e B em pré‐IC, não observamos diferença nos valores médios pré e pós‐IC a 500Hz; mas observamos melhor desempenho no teste de percepção pré‐IC (trissílabo) no Grupo B (Grupo A ‐ 9% e Grupo B ‐ 20%).

Esse achado pode ser explicado pelo fato de que a maioria dos indivíduos do Grupo A apresentou perda auditiva bilateral profunda, quando foram levadas em consideração frequências de 500 a 8000Hz, e esses pacientes foram implantados em situação de pior resto auditivo bilateral do que o Grupo B. Apesar da diferença no limiar audiométrico, não foi encontrada diferença estatística quando comparados os resultados pré‐operatórios do Teste de Percepção da Fala (TPF) entre os dois grupos. Os indivíduos de ambos os grupos tiveram bom desempenho no TPF pós‐operatório (Grupo A ‐ 85,25%; Grupo B ‐ 83,5%), em linha com os achados de Boisvert et al. (2015).14

Este resultado de TPF semelhante encontrado no pós IC nos dois grupos pode ser atribuído ao fato que nos indivíduos submetidos à cirurgia de IC no pior lado, lado com pior resíduo auditivo, permitiu o uso do aparelho de amplificação sonora individual no pós operatório no lado contralateral ao IC, permitindo a audição Bimodal ao longo de pelo menos 1 ano pós IC. Isso possibilitaria uma melhor percepção ou compreensão de palavras que o IC unilateralmente provem, favorecendo os mecanismos de estimulação central binaural que facilitariam o melhor desempenho auditivo para a pior orelha, mesmo quando analisada separadamente. Outro aspecto é que em nossa amostra pressupomos que os pacientes tiveram a mesma reabilitação auditiva, o que não pode ser garantido, pois este aspecto não pode ser totalmente controlado por se tratar de uma amostra retrospectiva. Os resultados apresentados na tabela 2 mostram que há uma melhoria nos limiares tonais puros após a cirurgia para ambos os grupos e que a comparação entre o melhor lado e o pior lado implantado não é diferente dos limiares tonais puros na cirurgia pré ou pós‐IC. Esses achados são consistentes com os resultados de Gantz et al. (2002)15 que, após 12 meses de IC, afirmam que não há relação entre os testes de avaliação pré‐operatória (testes audiológicos, eletrofisiológicos e de percepção da fala) e a melhoria da fala independentemente do lado da orelha implantado e deduzem que a melhor compreensão das palavras proporcionada pelo IC é decorrente de mecanismos centrais que facilitam o processo auditivo para a orelha pior e não dependem da presença ou ausência de células ciliadas cocleares.

Diferentemente de Firszt et al., 2012,9 quando sua amostra foi constituída de pacientes sem a indicação clássica para implante coclear, dada a elevada manutenção de audição residual na melhor orelha com os pacientes avaliados com aparelhos auditivos convencionais adaptado na melhor orelha, nossos critérios de indicação estiveram relacionados a perdas auditivas severa a profunda, com perda profunda na pior orelha. A exemplo do estudo de Lazard et al., 2015,16 implantando a melhor ou a pior orelha não existe qualquer efeito na performance pós implante coclear, confirmando que a implantação da pior orelha não diminui o resultado pós implante coclear e o nível de audição residual na melhor orelha tem influência positiva nos resultados pós implante coclear, quando é possível utilizar a estimulação bimodal.

Comparando os Grupos A e B quanto ao tempo de privação sonora menor ou igual a 10 anos e maior que 10 anos, observamos uma melhora no ganho de fala para o Grupo A nos indivíduos com menor tempo de privação sonora (p=0,0125) e no Grupo B observamos melhora no desempenho no TPF pós IC no grupo com menor privação sonora (p=0,0130), evidenciando que quanto maior a privação sonora, maior a correlação negativa nos TPF do pós operatório, como demonstrou Portmann et al., 2007.17 Pacientes que têm boa memória para sons e fala têm melhor performance com o IC. A cada 10% de aumento no acerto nos escores de sentenças correlaciona‐se, aproximadamente com um aumento de 4,4% nos escores de reconhecimento de palavras.18

Observamos também uma correlação entre os tempos de privação sonora quando implantamos o lado com pior reserva auditiva ao analisamos o nível auditivo médio pós IC, através da média na audiometria tonal nas frequências de 500 a 4000 Hz, ou seja, pacientes com maior tempo de privação sonora.

Estes resultados mostram que a escolha entre maior ou pior resto auditivo não interfere nos resultados audiológicos apresentados no pós‐operatório quando o paciente está abaixo de 10 anos de privação sonora e mostram que o que realmente pode interferir no resultado pós‐IC, mesmo em indivíduos pós‐linguais, é um tempo de privação sonora acima de 10 anos e nos possibilita supor que a estimulação das vias auditivas centrais depende apenas da presença de estímulo sonoro, e não de sua lateralidade.

Os artigos com evidência de nível 2a, 2b e 2c mostram que o benefício pós‐IC para a percepção da fala parece estar mais positivamente correlacionado com a integridade das vias auditivas do sistema nervoso central do que com o estado funcional da orelha interna e do nervo auditivo. Em pacientes com perda auditiva assimétrica, quando apenas uma orelha será implantada, a melhor escolha para o implante coclear é a orelha com pior limiar auditivo.

Vale ressaltar a necessidade de estudos adicionais nessa área, com um maior número de indivíduos, para assegurar uma melhor compreensão da contribuição da orelha contralateral para o IC nos resultados obtidos.

Conclusão

Não houve evidência estatística ao comparar Grupos A e B em relação ao lado (melhor ou pior) com implante coclear, em relação aos valores médios dos limiares auditivos obtidos e à percepção e teste de fala.

Houve diferença significativa entre os grupos estudados quando se comparou o tempo de privação auditiva.

A opção de implantar o dispositivo IC interno na orelha com menor resíduo auditivo e menor tempo de privação de som pode favorecer a audição bimodal, o que possibilitaria a soma binaural sem prejudicar a melhoria do limiar audiométrico e a percepção da fala.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Agradecimentos

A Denny Marcos Garcia pelo apoio na estatística e Maria Cecília Onofre pelo apoio técnico.

Referências
[1]
R.F. Bento, R. Brito Neto, A.M. Castilho, V.G. Gómez, S.B. Giorgi, M.C. Guedes.
Auditory results with multichannel cochlear implant in patients submitted to cochlear implant surgery at Medical School, Hospital das Clínicas, University of Sao Paulo.
Braz J Otorhinolaryngol, 70 (2004), pp. 632-637
[2]
A.G. Bittencourt, L.S. Ikari, A.A. Della Torre, R.F. Bento, R.K. Tsuji, R.V. Brito Neto.
Post‐lingual deafness: benefits of cochlear implants vs. conventional hearing aids.
Braz J Otorhinolaryngol, 78 (2012), pp. 124-127
[3]
M. Tamplen, A. Schwalje, L. Lustig, A.S. Alemi, M.E. Miller.
Utility of preoperative computed tomography and magnetic resonance imaging in adult and pediatric cochlear implant candidates.
Laryngoscope, 126 (2016), pp. 1440-1445
[4]
Y. Shiomi, Y. Naito, I. Honjo, N. Fujiki, K. Kaneko, H. Takahashi, et al.
Cochlear implant in patients with residual hearing.
Auris Nasus Larynx, 26 (1999), pp. 369-374
[5]
A. Incesulu, J.B. Nadol Jr..
Correlation of acoustic threshold measures and spiral ganglion cell survival in severe to profound sensorineural hearing loss: implications for cochlear implantation.
Ann Otol Rhinol Laryngol, 107 (1998), pp. 906-911
[6]
J.B. Nadol Jr., Y.S. Young, R.J. Glynn.
Survival of spiral ganglion cells in profound sensorineural hearing loss: implications for cochlear implantation.
Ann Otol Rhinol Laryngol, 98 (1989), pp. 411-416
[7]
J.F. Feuerstein.
Monaural versus binaural hearing: ease of listening, word recognition, and attentional effort.
Ear Hear, 13 (1992), pp. 80-86
[8]
E. Offeciers, C. Morera, J. Müller, A. Huarte, J. Shallop, L. Cavallé.
International consensus on bilateral cochlear implants and bimodal stimulation.
Acta Otolaryngol, 125 (2005), pp. 918-919
[9]
J.B. Firszt, L.K. Holden, R.M. Reeder, L. Cowdrey, S. King.
Cochlear implantation in adults with asymmetric hearing loss.
Ear Hear, 33 (2012), pp. 521-533
[10]
A. Patki, D.L. Tucci.
Choice of ear for cochlear implantation: implant the better or worse‐hearing ear?.
Laryngoscope, 125 (2015), pp. 5-6
[11]
M.A. Hyppolito, R.F. Bento.
Directions of the bilateral cochlear implant Brazil.
Braz J Otorhinolaryngol, 78 (2012), pp. 2-3
[12]
L. Geier, M. Barker, L. Fisher, J. Opie.
The effect of long‐term deafness on speech recognition in postlingually deafened adult CLARION cochlear implant users.
Ann Otol Rhinol Laryngol Suppl, 177 (1999), pp. 80-83
[13]
H.R. Nasralla, M.V. Goffi Gomez, A.T. Magalhaes, R.F. Bento.
Important factors in the cognitive development of children with hearing impairment: case studies of candidates for cochlear implants.
Int Arch Otorhinolaryngol, 18 (2014), pp. 357-361
[14]
I. Boisvert, C.M. McMahon, R.C. Dowell, B. Lyxell.
Long‐term asymmetric hearing affects cochlear implantation outcomes differently in adults with pre‐ and postlingual hearing loss.
PLOS ONE, 10 (2015), pp. e0129167
[15]
B.J. Gantz, R.S. Tyler, J.T. Rubinstein, A. Wolaver, M. Lowder, P. Abbas, et al.
Binaural cochlear implants placed during the same operation.
Otol Neurotol, 23 (2002), pp. 169-180
[16]
D.S. Lazard, C. Vincent, F. Venail, P. Van de Heyning, E. Truy, O. Sterkers, et al.
Pre‐, per‐ and postoperative factors affecting performance of postlinguistically deaf adults using cochlear implants: a new conceptual model over time.
[17]
D. Portmann, F. Felix, M. Negrevergne, M. Bourdin, P. Lagourgue, F. Coulomb-Faye, et al.
Bilateral cochlear implantation in a patient with long‐term deafness.
Rev Laryngol Otol Rhinol (Bord), 128 (2007), pp. 65-68
[18]
N.A. Gomaa, J.T. Rubinstein, M.W. Lowder, R.S. Tyler, B.J. Gantz.
Residual speech perception and cochlear implant performance in postlingually deafened adults.

Como citar este artigo: Amaral MS, Damico TA, Gonçales AS, Reis AC, Isaac ML, Massuda ET, et al. Is there a best side for cochlear implants in post‐lingual patients?. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:560–65.

A revisão por pares é de responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

Copyright © 2017. Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial
Idiomas
Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Announcement Nota importante
Articles submitted as of May 1, 2022, which are accepted for publication will be subject to a fee (Article Publishing Charge, APC) payment by the author or research funder to cover the costs associated with publication. By submitting the manuscript to this journal, the authors agree to these terms. All manuscripts must be submitted in English.. Os artigos submetidos a partir de 1º de maio de 2022, que forem aceitos para publicação estarão sujeitos a uma taxa (Article Publishing Charge, APC) a ser paga pelo autor para cobrir os custos associados à publicação. Ao submeterem o manuscrito a esta revista, os autores concordam com esses termos. Todos os manuscritos devem ser submetidos em inglês.