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Vol. 87. Núm. 1.
Páginas 114-117 (Janeiro - Fevereiro 2021)
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Vol. 87. Núm. 1.
Páginas 114-117 (Janeiro - Fevereiro 2021)
Relato de caso
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Neurectomia timpânica endoscópica no tratamento de fístulas persistentes da glândula parótida
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Hetal Marfatia, Asmita Madhavi, Ashwathy KP, Pankaj Goyal, Dharmishtha R. Kaku
Autor para correspondência
dharmi_11@yahoo.co.in

Autor para correspondência.
, Arpit Sharma
Seth G.S. Medical College, Department of Otorhinolaryngology, Mumbai, Índia
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Tabela 1. Classificação dos métodos relatados na literatura para o manejo das fístulas parótidas
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Introdução

A cirurgia endoscópica otológica foi introduzida em 19901 e tornou‐se popular nas últimas duas décadas. Ela mudou significativamente os conceitos cirúrgicos, anatômicos e fisiológicos. A introdução do endoscópio deu origem ao conceito de cirurgia otológica minimamente invasiva. A cirurgia endoscópica de orelha média permite uma excelente visualização da parede medial do mesotímpano, além da visualização de outras áreas ocultas, como os espaços epitimpânicos anteriores, retrotímpano e pré‐tímpano.

As fístulas de glândula parótida são raras e causadas por lacerações, cirurgias da glândula parótida, após infecções ou neoplasias. A persistência das fístulas da glândula parótida é motivo de grande preocupação e causa constrangimento ao paciente ao se alimentar. Não há um consenso uniforme em relação ao tratamento de escolha para fístulas crônicas da parótida e diferentes modalidades de tratamento já foram propostas (tabela 1).2 A neurectomia timpânica é útil em fístulas persistentes da parótida.2 A visão grande angular do endoscópio é útil para a neurectomia timpânica endoscópica transcanal. O nervo se divide no promontório, em um ramo anterior que sobe em direção à tuba auditiva e um ramo posterior que passa verticalmente, anterior ao nicho da janela redonda. Adicionalmente, além do ramo anterior e posterior, o nervo pode ter um ramo hipotimpânico ou mais ramos.3 Esses ramos estão localizados em um sulco e são cobertos apenas por mucosa ou estão localizados em um canal ósseo.2 A endoscopia abriu novos horizontes na abordagem desse nervo, pois o endoscópio ajuda na identificação precisa dos seus ramos.4

Tabela 1.

Classificação dos métodos relatados na literatura para o manejo das fístulas parótidas

Desvio da secreção da parótida   
Métodos de reconstruçãoReparo primário atrasado do ducto 
Reconstrução de ducto com enxerto venoso 
Retalhos de mucosa 
Sutura do ducto proximal à mucosa bucal 
Formação de uma fístula interna controlada   
Parotidectomia   
Diminuição da secreção da parótida   
Abordagens cirúrgicasLigadura de ducto 
Seccionamento do nervo de Jacobson ou nervo auriculotemporal 
Abordagens conservadorasSem alimentação oral, pressão e curativos oclusivos 
Antissialogogos: atropina, probantina 
Radioterapia 

Antes do advento do endoscópio, o microscópio era usado para este procedimento. Antes do advento do endoscópio, usávamos o microscópio na neurectomia timpânica em casos de fístulas persistentes da glândula parótida menor. O objetivo deste estudo foi descrever nossa experiência com neurectomia timpânica endoscópica nesses casos.

Relato de caso

Encontramos três pacientes com fístula persistente de parótida que não responderam ao tratamento conservador e foram submetidos à neurectomia timpânica endoscópica. O primeiro era um homem de 30 anos que havia sido submetido a incisão e drenagem de abscesso da parótida direita em outro hospital e no 8° dia após a drenagem ele notou secreção aquosa clara na face direita ao comer/engolir. Esse problema não respondeu à linha conservadora de tratamento e o paciente apresentou‐se em nosso serviço 3 meses após o procedimento de incisão e drenagem. A segunda paciente era uma menina de 12 anos, com história de secreção aquosa desde os 3 a 4 anos da região infra‐auricular direita quando se alimentava, com história de ruptura espontânea de abscesso de parótida direita após a qual ela desenvolveu fístula glandular direita. A terceira paciente era uma mulher de 34 anos submetida à cirurgia de parotidectomia superficial externa e no 14° dia após a cirurgia observou secreção aquosa da região infra‐auricular direita quando se alimentava.

No pré‐operatório, o teste do amido foi feito em todos os pacientes, no qual o local suspeito da fístula foi pintado com betadine e deixado até secar (fig. 1). Em seguida, o sialogogo foi administrado ao paciente e o local foi polvilhado com farinha de amido. No fim do teste de amido, o local fístula salivar pode ser visto claramente (fig. 2). O consentimento por escrito e informado foi obtido de todos os pacientes em relação ao procedimento. A anestesia geral foi administrada em um caso (menina de 12 anos), enquanto os outros 2 receberam anestesia local. Após esclarecimento completo sobre o procedimento, os pacientes foram submetidos à neurectomia timpânica.

Figura 1.

Local da fístula após a aplicação de betadine.

(0,1MB).
Figura 2.

Após polvilhar o local com amido e administrar o sialogogo, observa‐se o local do extravasamento salivar.

(0,12MB).

Um endoscópio de 3mm de diâmetro e 14cm de comprimento foi usado para melhor manuseio dos instrumentos. Uma das mãos segurava o endoscópio, enquanto a outra lidava com a instrumentação. Portanto, os microinstrumentos incorporados à aspiração oferecem a vantagem de não necessitar de uma ponta de aspirador separada. No entanto, eles têm a desvantagem de tornar o instrumento mais volumoso. As pontas de aspiração estão em ângulo reto com o instrumento, de modo que o tubo de aspiração não interfira durante a operação.

A incisão endomeatal de Rosen foi feita. O nervo timpânico com todos os seus ramos foi identificado no promontório (fig. 3). Um instrumento do tipo pick em ângulo reto foi usado para pinçar o nervo delicadamente. Em 2 casos, o nervo era submucoso, enquanto em um caso ele estava em um canal ósseo. Um segmento do nervo é cortado com pick de ponta afiada, removido, e as extremidades seccionadas são cauterizadas com cautério bipolar e broqueadas com broca skeeter de 0,6mm (fig. 4), de modo a evitar qualquer reinervação e, portanto, as recorrências. Durante o broqueamento, tomou‐se cuidado para não penetrar mais de 1 a 2mm no promontório.

Figura 3.

Seta aponta para o nervo timpânico no promontório.

(0,05MB).
Figura 4.

O local do promontório após o nervo ter sido seccionado, e as extremidades cauterizadas e broqueadas com uma broca skeeter (0,6mm).

(0,05MB).

Em um paciente em que a fístula ocorreu após a incisão e drenagem de abscesso da parótida, além do procedimento acima, aplicou‐se ácido tricloroacético a 20% no trato fistuloso.

No pós‐operatório, os pacientes foram orientados a manter uma dieta leve, com administração de antibióticos e antissialogogos, na forma de 0,5mg de glicopirrolato por uma semana. As consultas de seguimento foram feitas semanalmente nas duas primeiras semanas e, em seguida, após 1, 2 e 3 meses.

Não houve efeitos adversos após o procedimento, todos os pacientes relataram melhoria subjetiva dos sintomas em 2 semanas e, objetivamente, o teste do amido foi negativo. Houve cessação bem‐sucedida do fluxo da fístula parótida, sem recorrência ou quaisquer complicações no seguimento. O uso do endoscópio ajudou na identificação precisa dos ramos do nervo de Jacobson e também ajudou a reduzir o tempo operatório.

Discussão

O nervo de Jacobson é um ramo do nono nervo craniano e fornece fibras pré‐ganglionares secretomotoras parassimpáticas para a glândula parótida. Ele se origina no núcleo salivar inferior da medula oblonga.2 Ele se adentra no assoalho da orelha média e atravessa o promontório anteriormente como o nervo petroso superficial menor. O nervo faz sinapse no gânglio ótico e nas fibras pós‐ganglionares e, em seguida, entra na glândula parótida através do nervo auriculotemporal.5 A neurectomia timpânica elimina a atividade parassimpática na glândula parótida e é uma das modalidades de tratamento nos casos de fístula persistente da parótida. Também é útil em casos de síndrome de Frey e salivação excessiva.6 Seu uso também foi tentado em casos de estenose do ducto parotídeo, dilatação do ducto salivar (sialectasia), otalgia crônica intratável de origem glossofaríngea (que não responde a tratamento conservador),7 mas nossa experiência é limitada a esse respeito.

A fístula da glândula parótida ocorre mais frequentemente por lesões traumáticas e pode ser intraductal ou intraglandular. A fístula glandular pode responder bem ao tratamento conservador, enquanto a fístula ductal tem menor probabilidade de se fechar espontaneamente.8 Abordagens conservadoras, como antibióticos e drogas anticolinérgicas, são úteis, pois diminuem a produção de saliva. As fístulas que não respondem a tratamento conservador devem ser tratadas cirurgicamente. Radioterapia de baixa dose9 e excisão do trato fistuloso com ligadura do ducto parotídeo têm sido defendidas por alguns especialistas.10 A neurectomia timpânica é uma excelente modalidade de tratamento e, quando feita por via endoscópica, é minimamente invasiva, auxilia na excelente visualização e delineamento do nervo e reduz o tempo intraoperatório. Em todos os nossos casos houve alívio completo dos sintomas com fechamento bem‐sucedido da fístula em um período de duas semanas e teste de amido negativo, feito no fim de um mês. Em nossa série, a neurectomia timpânica foi bem‐sucedida no fechamento das fístulas ductais e glandulares. Às vezes, o efeito da neurectomia timpânica pode ser transitório, pois as fibras parassimpáticas que atingem o gânglio ótico através do gânglio geniculado ou por anastomoses entre a corda timpânica e o gânglio ótico podem não ser afetadas pela neurectomia timpânica. Entretanto, como o estímulo principal vem do nervo de Jacobson, a taxa de falha do procedimento é mínima.2 Portanto, se os efeitos da neurectomia timpânica são transitórios ou permanentes, parece ser menos significativo no caso de fístula da parótida, pois a supressão da atividade é longa o suficiente para permitir a cura do trato fistuloso e o alívio dos sintomas.

Conclusão

A neurectomia timpânica endoscópica é minimamente invasiva, custo‐efetiva e tem bom resultado terapêutico. Pode ser feita em regime de hospital‐dia. A neurectomia timpânica tem sido uma modalidade de tratamento bem estabelecida para fístulas persistentes da parótida no passado, mas recorrências foram observadas após o procedimento. Embora o microscópio tenha sido usado para neurectomia timpânica no passado, a endoscopia oferece excelente visualização da anatomia da orelha média e permite a identificação precisa do nervo. A combinação de duas técnicas consagradas – a neurectomia timpânica e uso de endoscópio em cirurgia otológica – mostra as vantagens de associar os dois métodos na correção de fístulas persistentes da parótida e, assim, melhorar o resultado final.

O ponto mais importante a destacar aqui é que o segmento do nervo de Jacobson deve ser excisado e as pontas seccionadas devem ser cauterizadas ou broqueadas, o que evitará qualquer reinervação e recorrências.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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Como citar este artigo: Marfatia H, Madhavi A, KP A, Goyal P, Kaku DR, Sharma A. Endoscopic tympanic neurectomy in the management of persistent parotid fistulae. Braz J Otorhinolaryngol. 2021;87:114–7.

A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

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