The SARS‐CoV‐2 virus causes COVID‐19, and it is responsible for the largest pandemic since the 1918 H1N1 influenza outbreak. The classic symptoms of the disease have been well defined by the World Health Organization; however, olfactory/gustatory disorders have been reported in some studies, but there are still several missing points in the understanding and in the consensus about the clinical management of these cases.
ObjectiveTo identify evidence in the scientific literature about olfactory/gustatory disorders, their clinical presentation, prevalence and possible specific treatments associated with COVID‐19.
MethodsA systematic review of articles published up to April 25, 2020 was performed in Medline, Cochrane Clinical Trials, ScienceDirect, Lilacs, Scopus and Google Schoolar, OpenGrey.eu, DissOnline, The New York Academy of Medicine and Research Gate. Inclusion criteria: (1) Studies on patients with COVID‐19; (2) Records of COVID‐19 signs/symptoms, and olfactory/gustatory functions. Exclusion criteria: (1) Studies on non‐human coronavirus; (2) Review articles; (3) Experimental studies (in animals or in vitro); (4) Olfactory/gustatory disorders initiated prior to SARS‐CoV‐2 infection. The risk assessment of bias of the selected studies was performed using the Newcastle‐Ottawa scale.
ResultsSix articles from the 1788 records met the inclusion criteria and were analyzed. A total of 1457 patients of different ethnicities were assessed; of them, 885 (60.7%) and 822 (56.4%) had smell and taste disorders, respectively, with women being most often affected. There were olfactory/gustatory disorders even without nasal obstruction/rhinorrhea and beginning even before the signs/symptoms of COVID‐19; the recovery of smell/taste, when it occurs, usually happened in the first two weeks after COVID‐19 resolution. There is evidence that olfactory/gustatory disorders are strong predictors of infection by SARS‐CoV‐2, and it is possible to recommend patient isolation, as early as of the medical consultation, preventing the spread of the virus. No scientific evidence has been identified for effective treatments for any of the disorders.
ConclusionOlfactory/gustatory disorders may occur at varying intensities and prior to the general symptoms of COVID‐19 and should be considered as part of the clinical features of COVID‐19, even in mild cases. There is still no scientific evidence of specific treatments for such disorders in COVID‐19 disease.
O vírus SARS‐CoV‐2 causa a COVID‐19 e é responsável pela maior pandemia desde o surto de influenza H1N1 de 1918. Os sintomas clássicos da doença já foram bem definidos pela Organização Mundial da Saúde; entretanto, distúrbios olfativo‐gustativos têm sido relatados em alguns estudos, mas ainda com várias lacunas no entendimento e no consenso sobre a condução clínica desses casos.
ObjetivoIdentificar evidências na literatura científica sobre os distúrbios olfativo‐gustativos acerca da apresentação clínica, prevalência e possíveis tratamentos específicos associados à COVID‐19.
MétodoRevisão sistemática de artigos publicados até 25 de abril de 2020 nas bases de dados: Medline, Cochrane Clinical Trials, ScienceDirect, Lilacs, Scopus e Google Schoolar, OpenGrey.eu, DissOnline, The New York Academy of Medicine e Research Gate. Foram critérios de inclusão: 1) Estudos com indivíduos com COVID‐19; 2) Registro dos sinais/sintomas da COVID‐19 e das funções olfativo‐gustativa. Foram critérios de exclusão: 1) Estudos sobre coronavírus não humano; 2) Artigos de revisão; 3) Estudos experimentais (em animais ou in vitro); 4) Distúrbios olfativos‐gustativos iniciados previamente à infecção pelo SARS‐CoV‐2. A avaliação de risco de viés dos estudos selecionados foi feita por meio da escala de Newcastle‐Ottawa.
ResultadosSeis artigos dos 1.788 registros foram selecionados. Um total de 1.457 pacientes de diversas etnias foi avaliado; desses, 885 (60,7%) apresentaram perda do olfato e 822 (56,4%) perda do paladar, sendo as mulheres as mais afetadas. Os distúrbios olfativo‐gustativos estiveram presentes mesmo sem obstrução nasal/rinorreia e com início mesmo antes dos sinais/sintomas clínicos da COVID‐19; a recuperação do olfato/paladar, quando ocorre, geralmente se dá nas duas primeiras semanas após a resolução da doença. Há evidências de que os distúrbios olfativo‐gustativos sejam fortes preditores de infecção pelo SARS‐CoV‐2, podendo‐se recomendar o isolamento do paciente, já a partir da consulta médica, para evitar a disseminação do vírus. Não foram identificadas evidências científicas para tratamentos eficazes para qualquer dos distúrbios.
ConclusãoPodem ocorrer distúrbios olfativo‐gustativos em intensidades variáveis e prévios aos sintomas gerais da COVID‐19, devem ser considerados como parte dos sintomas da doença, mesmo em quadros leves. Não há ainda evidências científicas de tratamentos específicos para tais distúrbios na COVID‐19.
O olfato e o paladar são funções sensoriais imprescindíveis tanto para a boa qualidade de vida como para preservação dela ao identificar diversos odores e sabores nocivos. As infecções virais de vias aéreas superiores (IVAS) podem levar a distúrbios olfativos (DO) e gustativos (DG) de graus e durações variáveis1 e em 70% dos casos causados por rinovírus, vírus influenza e parainfluenza, vírus sincicial respiratório, adenovírus e pelo vírus da síndrome respiratória aguda grave (SARS‐CoV‐2).2
A doença do coronavírus 2019 (COVID‐19) tornou‐se uma pandemia viral que emergiu do leste da Ásia causada pelo SARS‐CoV‐2.3 No Brasil, o número de casos segue crescente com mais de 66 mil casos confirmados até o fim de abril de 2020;4 entretanto, estima‐se que o número seja ainda maior, pois o número de testes feitos ainda é insuficiente para a demanda nacional.
Na COVID‐19, os sintomas otorrinolaringológicos mais comuns são tosse, dor de garganta e dispneia; rinorreia e congestão nasal também foram encontrados; entretanto, há relatos de DO/DG5,6 e de estarem presentes mesmo antes da confirmação molecular da infecção pelo SARS‐CoV‐2;6,7 essas observações foram feitas recentemente, em países que passaram a fazer testes moleculares para COVID‐19 de forma mais ampla em que pacientes infectados por SARS‐CoV‐2 relatavam DO e DG graves sem rinorreia ou obstrução nasal. No início, não havia suspeita de COVID‐19 em alguns desses pacientes, pois não apresentavam febre, tosse ou qualquer outro sinal/sintoma geral clássico da COVID‐19. Os DO e DG na COVID‐19 ainda permanecem com lacunas no entendimento tanto do espectro clínico quanto do tratamento a ser proposto.
O avanço do conhecimento sobre um tema específico pode ser facilitado por meio de revisões sistemáticas (RS) que possibilitam identificar, analisar e sintetizar as melhores evidências científicas para melhores práticas clínicas, sobretudo diante de novos cenários clínicos como a atual pandemia de COVID‐19 em que estudos controlados randomizados e recomendações precisas para o seu gerenciamento ainda não estão disponíveis. O objetivo desta RS é identificar evidências do conhecimento atual sobre distúrbios olfatórios‐gustatórios acerca da apresentação clínica, prevalência e possíveis tratamentos específicos associados à COVID‐19.
MétodoA formulação desta revisão sistemática (RS) buscou responder a seguinte pergunta: “Qual a associação dos distúrbios olfatório/gustatórios, suas apresentações clínicas e tratamentos, com a COVID‐19?”, construída com a ajuda da estratégia de PICO. Esta RS está de acordo com os itens do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta‐Analyses Statement (Prisma).8 O protocolo foi registrado em 24 de abril de 2020 no banco de dados International Prospective Register of Systematic Reviews – Prospero (https://www.crd.york.ac.uk/PROSPERO/) sob o número de registro CRD42020181524.
Estratégia de buscaAs estratégias objetivaram uma busca completa, incluíram descritores (Medical Subject Headings ‐ Mesh) e termos livres, os quais consistiram em: COVID‐19, 2019‐nCoV, 2019 novel coronavirus pneumonia, SARS‐CoV, SARS‐CoV‐2, sars coronavirus, coronavirus, coronavirus infection, coronavirus COVID‐19, novel coronavirus), COVID‐19 clinical features,olfactory disorders,olfaction disorders e taste disorders. Para identificar os artigos pertinentes com a questão proposta, foi elaborada uma estratégia de busca: (COVID‐19 OR 2019‐nCoV OR 2019 novel coronavirus pneumonia OR SARS‐CoV OR SARS‐CoV‐2 OR sars coronavirus OR coronavirus OR coronavirus infection OR coronavirus COVID‐19 OR novel coronavirus) AND (COVID 19 clinical features OR olfactory disorders OR olfaction disorders OR taste disorders); essa estratégia foi adaptada às bases de dados, os termos correspondentes foram aplicados em português e espanhol na Lilacs. Não houve restrição ao idioma de publicação. A estratégia de pesquisa completa é mostrada no material suplementar (Apêndice 1).
Entre 2 e 25 de abril de 2020 foram pesquisadas as seguintes bases de dados eletrônicas: Medline via PubMed, Cochrane Clinical Trials, ScienceDirect, Lilacs, Scopus e Google Schoolar, bem como a literatura cinzenta OpenGrey.eu, DissOnline, The New York Academy of Medicine e Research Gate. Para evitar viés de citação, não houve busca manual dos artigos incluídos e não foram contatados especialistas da área.9
Após a busca, as referências de cada banco de dados foram exportadas para o programa Mendeley® (https://www.mendeley.com/) com o objetivo de identificar todos os artigos duplicados, promover maior confiabilidade na seleção e prosseguir para a etapa de elegibilidade dos artigos.
Critérios de elegibilidadeForam considerados critérios de inclusão: 1) Estudos observacionais com indivíduos com diagnóstico de infecção por coronavírus; 2) Registro dos sinais e sintomas da COVID‐19 com aspectos clínicos relacionados à função olfativa e/ou gustativa. Foram considerados critérios de exclusão: 1) Estudos sobre coronavírus não humano; 2) Artigos de revisão; 3) Estudos experimentais (em animais ou in vitro); 4) Relato clínico de DO/DG com início prévio ao quadro de infecção pelo SARS‐CoV‐2.
Extração dos dadosA busca dos artigos foi feita por dois avaliadores. Os títulos e resumos dos artigos recuperados foram avaliados, de forma independente, por dois investigadores que não estavam cegos para os autores ou os títulos de periódicos. As versões completas dos artigos potencialmente elegíveis foram recuperadas para avaliação mais aprofundada e foi feita em três etapas:
- 1.
Identificação e leitura de títulos em diferentes bases de dados eletrônicas. Foram excluídos os artigos que claramente não preenchessem qualquer dos critérios de inclusão ou exclusão.
- 2.
Leitura de resumos dos estudos selecionados na primeira fase. Da mesma forma, excluíram‐se os artigos que claramente não preenchiam algum dos critérios de inclusão ou exclusão.
- 3.
Todos os estudos que não foram excluídos nesses dois primeiros estágios foram lidos na íntegra para a seleção dos que seriam incluídos nesta revisão sistemática (RS).
Os dados principais de cada artigo foram totalmente coletados e inseridos em um banco de dados estruturado no programa Microsoft Office Excel 2010®. Não houve divergências entre os avaliadores. Um formulário padrão para armazenamento de dados foi criado com base no modelo adotado pela Cochrane.10 Para melhor apresentação dos resultados, decidiu‐se considerar as seguintes variáveis dos artigos selecionados: título, autor, local, desenho do estudo, tamanho da amostra (N), média de idade e etnia dos pacientes, tanto o método de diagnóstico como os sinais/sintomas gerais mais prevalentes e a gravidade do quadro clínico da COVID‐19, métodos usados na avaliação olfativa‐gustativa e as prevalências dos DO e DG. Os desfechos procurados nos estudos foram tanto os dados demográficos, prevalência e expressões clínicas dos DO/DG como possíveis tratamentos específicos para tais distúrbios em pacientes com diagnóstico de COVID‐19.
Avaliação do risco de viésO risco de viés foi avaliado de acordo com as recomendações do manual e da escala de Newcastle‐Ottawa adaptada para estudos observacionais transversais.11 A qualidade dos trabalhos foi avaliada por dois pesquisadores de forma independente e as divergências avaliadas por consenso. A pontuação máxima a ser atingida foi de 10 pontos e os itens avaliados da escala foram: 1) Representatividade da amostra; 2) Tamanho da amostra; 3) Caracterização do diagnóstico; 4) Apuração da exposição (fator de risco); 5) Comparabilidade, para investigar se os indivíduos em diferentes grupos de resultados são comparáveis, com base no projeto do estudo ou análise, controle dos fatores de confusão; 6) Avaliação dos resultados e 7) Teste estatístico (tabela 1).
Escala de Newcastle‐Ottawa adaptada para estudos observacionais transversais
I Seleção: (máximo: 5 estrelas) |
1. Representatividade da amostra: |
a) Verdadeiramente representativo da média na população‐alvo.★ (todos os sujeitos ou amostra randomizada) |
b) Um pouco representativo da média na população‐alvo.★ (amostra não randomizada) |
2. Grupo de usuários selecionados |
a) Seleção relevante de indivíduos para excluir fatores que influenciam os resultados (como certas doenças ou medicamentos que têm um efeito negativo/positivo em alguma condição).★ |
3. Tamanho da amostra: |
a) justificada e satisfatória (poder do cálculo incluído).★ |
4. Diagnóstico: |
a) Caracterização do diagnóstico.★★ |
b) Determinação da exposição.★ |
II Comparabilidade: (máximo: 2 estrelas) |
1. Os sujeitos em diferentes grupos de resultados são comparáveis, com base no desenho ou análise do estudo. Fatores de confusão são controlados. |
a) O estudo controla o fator mais importante (selecione um).★ |
b) O controle do estudo para qualquer fator adicional.★ |
III Resultados: (máximo: 3 estrelas) |
1. Determinação do método: |
a) Método de medição validado.** |
b) Método de medição não validado, mas o método está disponível ou descrito.* |
2. Testes estatísticos: |
a) O teste estatístico usado para analisar os dados é claramente descrito e apropriado, e a medição da associação é apresentada; incluindo DP/EP e o nível de probabilidade (valor de p).* |
TOTAL (máximo: 10 estrelas) |
Após essas avaliações, os estudos selecionados foram submetidos a uma análise estatística para verificar a possibilidade de se construir uma metanálise. Essa análise combina e resume os resultados de vários estudos, aumenta assim a precisão e o poder da evidência dos resultados.
ResultadosEstudos incluídosNa primeira fase desta RS, 1.788 artigos foram encontrados em seis bases de dados e nenhum na literatura cinzenta. Após a eliminação de 1.023 estudos duplicados, foram selecionados 765 para leitura de títulos e resumos. Foram excluídos 749 de acordo com os critérios de seleção estabelecidos (62 estudos sobre coronavírus não humano, 301 por ausência de dados sobre aspectos clínicos, 375 revisões de literatura e 11 estudos experimentais in vitro) e 16 artigos foram selecionados para leitura na íntegra. Após a leitura, 10 artigos foram excluídos por não ter dados sobre o olfato/paladar (tabela 2). Portanto, seis textos completos foram incluídos na análise qualitativa (tabela 3). Todo o processo de seleção de artigos é descrito na figura 1, que mostra o diagrama de fluxo Prisma para inclusão.
Textos completos excluídos da análise
Autor | Localização | Ano | Motivo da exclusão |
---|---|---|---|
Chen et al. | China | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Cheng et al. | China | 2019 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Huang et al. | China | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Jin et al. | China | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Piva et al. | EUA | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Tian et al. | China | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Wang et al. | China | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Young et al. | Singapura | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Zheng et al. | China | 2019 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Zhu et al. | China | 2020 | Ausência de dados sobre olfato/paladar |
Estudos selecionados de acordo com os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos na revisão sistemática
Artigo | Título | Autor | Local | Desenho do estudo | n |
---|---|---|---|---|---|
1 | Neurological Manifestations of Hospitalized Patients with COVID‐19 in Wuhan, China: a retrospective case series study. | Mao et al.12 | China | Retrospectivo | 214 |
2 | Olfactory and gustatory dysfunctions as a clinical presentation of mild‐to‐moderate forms of the coronavirus disease (COVID‐19): a multicenter European study. | Lechien et al.13 | Bélgica, França, Espanha e Itália | Multicêntrico (transversal) | 417 |
3 | Smell Dysfunction: A Biomarker for COVID‐19. | Moein et al.14 | Irã | Transversal, observacional | 60 |
4 | Association of Chemosensory Dysfunction and COVID‐19 in Patients Presenting with Influenza‐like Symptoms. | Yan et al.15 | EUA | Transversal, observacional | 59 |
5 | Self‐reported olfactory loss associates with outpatient clinical course in COVID‐19. | Yan et al.16 | EUA | Retrospectivo | 128 |
6 | Loss of smell and taste in combination with other symptoms is a Strong predictor of COVID‐19 infection. | Menni et al.17 | Reino Unido | Survey | 579 |
Total | 1457 |
A análise da qualidade dos artigos incluídos, e consequentemente do risco de viés, é mostrada na tabela 4. Todos os estudos incluídos caracterizam‐se como estudos observacionais e transversais. Além disso, na avaliação final, todos obtiveram percentual de qualidade igual ou superior a 80% (8/10); quatro dos seis artigos encontrados obtiveram a pontuação máxima de 90% (9/10).
Avaliação da qualidade de estudos transversais pela escala Newcastle‐Ottawa (adaptada)
Artigo | Seleçãoa | Comparabilidade (controle de fator mais importante)b | Resultadoc | Avaliação finald | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Representatividade da amostra | Seleção relevante | Tamanho da amostra | Determinação da exposição/ diagnóstico | Método de medição validado | Teste estatístico | |||
Mao et al.12 | 1 | 1 | 0 | 3 | 1 | 2 | 1 | 9 |
Lechien et al.13 | 1 | 1 | 0 | 3 | 1 | 2 | 1 | 9 |
Moein et al.14 | 1 | 0 | 0 | 3 | 1 | 2 | 1 | 8 |
Yan et al.15 | 1 | 0 | 0 | 3 | 1 | 2 | 1 | 8 |
Yan et al.16 | 1 | 1 | 0 | 3 | 1 | 2 | 1 | 9 |
Menni et al.17 | 1 | 1 | 1 | 3 | 1 | 2 | 1 | 9 |
Apenas um dos trabalhos fez um estudo censitário, os demais trabalhos não fizeram seleção randomizada dos pacientes, o que compromete a representatividade das amostras, mas preocuparam‐se com o tamanho da amostra.
Todos os estudos tiveram preocupação com a seleção dos participantes, definiram os critérios de inclusão e exclusão, com o objetivo de excluir fatores que pudessem influenciar os resultados encontrados.
O tamanho das amostras estudadas foi adequado ao teorema do limite central para todos os estudos, apenas dois estudos com amostras menores do que 300 sujeitos.
A caracterização do diagnóstico e a determinação da exposição estavam muito bem descritas em todos os estudos. Todos os trabalhos controlaram pelo menos uma variável que permitisse uma comparação eficiente entre todos os estudos.
A avaliação dos resultados foi feita em todos os trabalhos por meio de relatório próprio e os métodos estavam descritos e eram validados em todos os estudos.
Por fim, todos os trabalhos apresentaram testes estatísticos apropriados, com descrição dos testes estatísticos, dos níveis de significância e dos aplicativos usados.
Não foi possível fazer uma metanálise nesta RS porque os artigos incluídos apresentavam metodologias e medidas muito diferentes resultantes dos testes.
Análise dos dadosEm relação às características gerais dos artigos incluídos (tabela 3), os seis estudos foram publicados em 2020, um na China,12 um na Europa,13 um no Irã,14 dois nos Estados Unidos15,16 e um na Inglaterra.17 O estudo chinês (Mao et al.)12 avaliou 214 pacientes de três hospitais em Wuhan de forma retrospectiva; o estudo europeu (Lechien et al.)13 avaliou de forma transversal 417 pacientes num modelo multicêntrico; o estudo iraniano (Moein et al.)14 estudou 60 pacientes com infecção pelo COVID‐19 e 60 sujeitos no grupo controle, emparelhados pela idade e sexo; os dois estudos americanos foram feitos pelo mesmo grupo de pesquisadores (Yan et al.);15,16 já o estudo inglês (Menni et al.)17 avaliou, por meio de um estudo censitário, 579 pacientes COVID‐19 positivos e 1.123 negativos. Os dados demográficos, sintomas gerais e a prevalência dos DO e DG nos pacientes nos seis estudos podem ser vistos no tabela 5.
Dados demográficos, clínicos gerais, método diagnóstico olfatório‐gustatório, prevalência dos distúrbios olfatório e gustatório nos pacientes nos três estudos selecionados
Artigo | Autor | N: n (%) | Idade (±DP) | Etnias, n (%) | Diagnóstico da COVID‐19 | Severidade da COVID‐19, n (%) | Sintomas/sinais gerais na COVID‐19, n (%) | Método de avaliação olfatória/ gustatória | Prevalência, n (%) |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | Mao et al.12 | 214: 127 (59,3)♀ 87 (40,7)♂ | 52,7 (±15,5) anos | Asiática 214 (100) | RT‐PCRa | Severa 88 (41,1) | Febre 132 (61,7) | Análise dos registros clínicos no prontuário | Desordem gustatória 12 (5,6) |
Tosse seca 107 (50) | |||||||||
Leve‐moderada 126 (58,9) | Anorexia 68 (31,8) | Desordem olfatória 11 (5,1) | |||||||
2 | Lechien et al.13 | 417: 263 (63,1)♀; 154 (36,9)♂ | 36,9 (±11,4) anos | Europeia 389 (93,3) | RT‐PCRa | Leve‐moderada 417 (100) | Tosse seca 325 (78) | sQOD‐NSb | Desordem olfatória 357 (85,6) |
Africana 15 (3,6) | Mialgia 241 (58) | ||||||||
Sul‐americana 11 (2,7) | Anorexia 216 (52) | Desordem gustatória 342 (82) | |||||||
Norte‐americana 1 (0,2) | Febre 200 (48) | ||||||||
Asiática 1 (0,2) | |||||||||
3 | Moein et al.14 | 60: 20 (33,3)♀; 40 (66,6)♂ 60 (controle) | 46,55 (±12,17) anos | Asiática 60 (100) | RT‐PCRa | Leve 25(42) | Febre 46 (77) | UPSITc | Desordem olfatória 59 (98,3) |
Moderada 29 (48) | Tosse seca 35 (58) | ||||||||
Severa 6 (10) | Falta de ar 31 (52) | Desordem gustatória 14 (24) | |||||||
4 | Yan et al.15 | 58: 38 (64,4)♂; 20 (35,6)♀ e 203 COVID‐19 negativos. | <50 anos: 38 (65,5) | Norte‐americanos 58 (100) | RT‐PCRa | Leve 54 (93,1) | Fadiga 48 (81,4) | Questionário | Distúrbio gustatório 41 (71,2) |
>50 anos: 21 (34,5) | Moderada/ severa 4 (6,9) | Febre 41 (69,5) | Distúrbio olfatório 40 (67,8) | ||||||
5 | Yan et al.16 | 128: 67 (52,3)♀; 61 (47,7)♂ | 48,25 (±16,75) anos | Norte‐americanos 8 (30,8) | RT‐PCRa | Leve 102 (79,7) | Tosse seca 112 (87,5) | Prontuário, e‐mail e telefone. | Distúrbio olfatório 75 (58,6%) |
Africano 3 (11,5) | Febre 90 (70,3) | ||||||||
Sul‐americano 7 (26,9) | Moderado/ graves 26 (20,3) | Fadiga 90 (70,3) | Distúrbio gustatório 70 (54,6%) | ||||||
Asiática 4 (15,4) | |||||||||
Outros 4 (15,4) | |||||||||
6 | Menni ey al.17 | 579: 400 (69)♀; 179 (31)♂ e 1123 negativos para COVID‐19. | 40,79 (±11,84) anos | Não avaliado | RT‐PCRa | Leve 579 (100) | Fadiga 458 (80,1) | Aplicativo RADAR COVID‐19 | Distúrbio olfatório/gustatório 343 (59,4) |
Tosse seca 335 (58) | |||||||||
Falta de ar 194 (49,4) |
♂, Sexo masculino; ♀, Sexo feminino; DP, desvio‐padrão.
Real‐time reverse transcription polymerase chain reaction (Reação de cadeia de polimerase da transcriptase reversa em tempo real).
Os seis estudos avaliaram 1.457 pacientes (tabela 3). No estudo de Mao et al.,12 a amostra foi composta apenas por pacientes chineses; no estudo de Lechien et al.,13 a maior parte da amostra foi composta por pacientes europeus; no estudo de Moein et al.,14 todos eram iranianos; nos dois estudos de Yann et al.,15,16 a maioria era americana; no estudo de Menni et al.,17 a etnia não foi registrada.
O exame usado para diagnóstico da COVID‐19 nos seis estudos foi o RT‐PCR (Real‐Time Reverse Transcription Polymerase Chain Reaction). Em relação aos sinais/sintomas gerais mais prevalentes da COVID‐19, houve diferenças entre os grupos; a febre foi o sinal mais prevalente nos estudos de Mao et al.12 e de Moein et al.;14 a fadiga foi o primeiro sintoma no primeiro estudos de Yan et al.15 e de Menni et al.;17 já a tosse foi o primeiro sinal no segundo estudo de Yan et al.16 e no estudo de Lechien et al.13 (tabela 5).
Mao et al.12 conduziram o estudo em três hospitais designados para o atendimento de pacientes com COVID‐19 pertencentes à Union Hospital of Huazhong University of Science and Technology em Wuhan, China. Os dados clínicos foram extraídos de registros médicos eletrônicos e revisados por uma equipe treinada de médicos. Os sintomas neurológicos se enquadram em três categorias: sintomas musculares esqueléticos, sintomas ou doenças do sistema nervoso central (SNC) e sintomas do sistema nervoso periférico (SNP), entre eles os DO e DG. Os dados de todos os sintomas neurológicos foram verificados por dois neurologistas treinados. Dos 214 pacientes estudados, 126 (58,9%) eram quadros leve‐moderados, 127 (59,3%) eram mulheres e a idade média do grupo foi de 52,7±15,5 anos. Comparado com pacientes leve‐moderados, os pacientes graves eram mais velhos (58,7±15,0 vs. 48,9±14,7 anos) e mostraram sintomas menos típicos, como febre 40 (45,5%) vs. 92 (73%) e tosse 30 (34,1) vs. 77 (61,1). A DG foi identificada em 12 (5,6%), enquanto a DO em 11 (5,1%); sobre esses distúrbios, só havia referências de hipogeusia e hiposmia e foram os principais sintomas relatados pelos pacientes com alterações no SNP 12/19 (63%), 11/19 (57,8%); respectivamente. Não havia registros relativos ao período de início dos distúrbios olfatório/gustatório, duração, resolução ou tratamentos específicos.
Lechien et al.13 conduziram o estudo europeu multicêntrico por meio da COVID‐19 Task Force of theYoung‐Otolaryngologists of the International Federations of Oto‐rhino‐laryngological Societies (YO‐IFOS) em seis hospitais belgas, três italianos e dois franceses. Foram excluídos pacientes com disfunções olfativo‐gustativas com início anterior à pandemia, pacientes sem diagnóstico laboratorial para COVID‐19, pacientes que estavam na unidade de terapia intensiva no momento do estudo (devido ao seu estado de saúde); logo, a amostra foi composta apenas com pacientes com formas leve‐moderadas. Os dados clínicos foram coletados prospectivamente durante a consulta otorrinolaringológica ou por telefone para pacientes em tratamento domiciliar. Neste estudo, os pacientes responderam um questionário baseado no The smell and taste component of the National Health and Nutrition Examination Survey e a versão simplificada do Questionnaire of Olfactory Disorders‐Negative Statements (sQOD‐NS).18 Dos 417 pacientes, 389 (93,3%) eram europeus, 263 (63,1%) eram mulheres, todos com quadros leve‐moderados de COVID‐19 e com idade média de 36,9±11,4 anos. Na amostra avaliada, 85,6% e 88,8% dos pacientes relataram DO e DG, respectivamente; houve associação significativa entre os dois distúrbios (p<0,001). Entre os 357 pacientes com DO, 284 (79,6%) apresentaram anosmia, 73 (20,4%) hiposmia, 45 (12,6%) fantosmia e 115 (32,4%) parosmia. As DO surgiram antes, durante ou depois dos outros sinais/sintomas da COVID‐19 em 11,8%; 22,8% e 65,4% dos casos, respectivamente. Entre os pacientes já recuperados da COVID‐19, 63% deles permaneceram com DO. Entre os pacientes que recuperaram o olfato, 33%; 39,6%; 24,2% e 3,3% ocorreram nos períodos de 1‐4, 5‐8, 9‐14 e acima de 15 dias de resolução do quadro de COVID‐19, respectivamente; nos casos de anosmia, a função olfativa normalizou‐se ao longo dos oito primeiros dias após a resolução da doença em 67,8% dos casos. Observou‐se associação entre a febre e a anosmia (p=0,014). As mulheres foram significativamente mais afetadas por DO (tanto com hiposmia como com anosmia) e DG do que os homens (p=0,001). As mulheres foram proporcionalmente mais afetadas por hiposmia ou anosmia em comparação aos homens (p <0,001). Acerca do tratamento para DO, foram usadas lavagem nasal salina, corticoide nasal e corticoide oral em 16,7%; 8,1% e 2,5%, respectivamente; as DG foram tratadas em 1,4% dos casos com de L‐carnitina ou oligoelementos associados a vitaminas. Não foram observados resultados referentes à eficácia de tais tratamentos específicos para DO e DG.
Moein et al.14 conduziram o estudo com 60 pacientes positivos para SARS‐CoV‐2 admitidos no Masih Daneshvari Hospital em Teerã, Irã. No momento do teste olfativo, todos estavam internados no período de recuperação da doença. Foi criado um grupo controle com 60 sujeitos saudáveis pareados por sexo e idade com os 60 pacientes com a infecção. A versão em persa do teste de identificação de cheiro da Universidade da Pensilvânia (UPSIT), com 40 odores, foi usada neste estudo (Sensonics International, Haddon Hts., NJ, EUA) com a ajuda de um examinador treinado; o teste fornece um índice de disfunção absoluta (anosmia, hiposmia grave, hiposmia moderada hiposmia leve, normosmia, fingimento), bem como disfunção relativa com base nas classificações de percentis normativos ajustados por idade e sexo. Dos 60 pacientes com COVID‐19 estudados, 25 (42%) eram quadros leves, 29 (48%) eram moderados e 6 (10%) eram graves, 40 (66,6%) eram homens e a idade média do grupo foi de 46,5±12,1 anos. Dos 60 pacientes, a DO foi identificada em 59 (98,3%) e a DG em 14 (24%), contrastou com o grupo controle, que apresentou DO em 18% dos sujeitos; entre os 60 pacientes, 15 (25%) apresentaram anosmia, 20 (33%) hiposmia grave, 16 (27%) hiposmia moderada, 8 (13%) hiposmia leve e um (0,2%) normal. Os 59 pacientes com DO informaram que a desordem iniciou‐se ao mesmo tempo ou imediatamente após o início dos sinais/sintomas da COVID‐19. Não havia dados de detalhamento sobre o tipo de distúrbio gustatório presente e nem de tratamentos específicos para os DO/DG na amostra estudada.
Em seu primeiro estudo, Yan et al.15 avaliaram 58 pacientes do hospital da University of California San Diego Health com teste laboratorial positivo para COVID‐19 e 203 negativos. Os DO e os DG foram avaliados com a ajuda de um questionário por meio de uma plataforma (Qualtrics®); as perguntas foram baseadas em uma barra contínua de 10 pontos para a função olfativa, significaram: 0 (anosmia), 10 (olfato normal); e uma barra de 10 pontos para a função gustativa, significaram: 0 (ageusia), 10 (paladar normal); quanto menor a pontuação, maior a gravidade dos DO e DG. Dos 58 pacientes com COVID‐19 estudados, 54 (93,1%) eram quadros leves, 29 (50%) eram homens e 38 (64,4%) estavam abaixo dos 50 anos. A perda de olfato e paladar foi relatada em 40 (68%) e 42 (71%) dos indivíduos COVID‐19 positivos, respectivamente. Em 12 (22%) dos pacientes, o DO estava presente já no início do quadro. O comprometimento do olfato e do paladar foi associado, de forma independente e forte, à positividade da COVID‐19 (Anosmia: Razão de Chances Ajustada ‐ Aor=10,9; 95% IC: 5,08‐23,5; Ageusia: Aor=10,2; 95% IC: 4,74‐22,1). Em comparação com outros sintomas da infecção pela COVID‐19, as perdas de olfato e paladar mostraram as maiores magnitudes de associação com a positividade para COVID‐19 (Anosmia: OR=10,9; 95% IC: 5,6‐21,0; Ageusia: OR=11,9; 95% IC: 6,1‐23,2) Dos pacientes que relataram o DO, 43 (73,6%) relataram resolução da anosmia em intervalos diferentes após a recuperação do quadro da COVID‐19 (18,4% ‐ na primeira semana; 36,8% ‐ na segunda semana, e 18,4% ‐ na terceira ou quarta semana); em 15 (26,4%) dos casos não houve recuperação do olfato. Não foram observados resultados referentes à resolução do quadro de DG e nem sobre tratamentos específicos para ambos os distúrbios.
Em seu segundo estudo, Yan et al.16 avaliaram de forma retrospectiva 128 pacientes com teste laboratorial positivo para COVID‐19 registrados no sistema do Hospital San Diego. O olfato e o paladar foram autoavaliados em relação ao período da doença e foram comparados aos níveis antes da doença (perda de olfato/paladar vs. normal); a princípio, esses dados foram extraídos nos registros dos prontuários dos pacientes, quando ausentes, a entrevista era feita via e‐mail ou telefone. Dos 128 pacientes com COVID‐19, 102 (79,7%) eram quadros leves, 67 (52,3%) eram mulheres e a média de idade foi de 48,25±16,75 anos. Dos 128 pacientes, 75 (58,6%) apresentavam DO e 70 (54,6%) tinham DG. Os pacientes que relataram perda de olfato tiveram dez vezes menos chances de ser internados pela COVID‐19 (OR=0,09; 95% IC: 0,01‐0,74) em comparação com aqueles sem perda de olfato. Os DO não se associaram a qualquer outra medida tipicamente relacionada à decisão de internar, sugeriu que a perda do olfato é verdadeiramente um fator que pode servir como um marcador para manifestações mais leves da COVID‐19. Assim, os autores sugerem que o DO pode ser um marcador clínico para ajudar a estratificar a gravidade da doença no início da infecção por SARS‐CoV‐2. Não havia dados de detalhamento sobre o tipo de DG presente e nem de tratamentos específicos para qualquer dos distúrbios na amostra estudada.
Menni et al.17 conduziram um estudo censitário por meio do aplicativo Radar COVID‐19 com 579 pacientes positivos para SARS‐CoV‐2 na Inglaterra e 1.123 negativos. Dos 579 pacientes, todos eram quadros leves, 400 (69%) eram mulheres e a média de idade foi de 40,79±11,84 anos. Os DO e DG estiveram presentes em 341 (59%) dos pacientes positivos para COVID‐19 em comparação com 202 (18%) daqueles negativos para o teste, resultou em uma razão de chances (OR) do diagnóstico da COVID‐19 (95% CI=6,59 [5,25; 8,27], p=1,90×10‐59). A combinação de perda de olfato e paladar, febre, tosse persistente, fadiga, diarreia, dor abdominal e perda de apetite foi preditiva para teste positivo para COVID‐19 com sensibilidade de 0,54 (0,44; 0,63); especificidade 0,86 (0,80; 0,90): ROC‐AUC=0,77 (0,72; 0,82) no conjunto de testes e validação cruzada ROC‐AUC=0,75 (0,72; 0,77). No geral, sem ajustes, a perda do olfato e do paladar teve um valor preditivo positivo de 61,7%. Os resultados sugerem que a perda de paladar/olfato é um forte preditor de infecção pelo SARS‐CoV‐2. Não havia dados de detalhamento sobre o subtipo dos DO e DG, início e resolução em relação ao quadro da COVID‐19 e nem de tratamentos específicos para qualquer dos distúrbios.
DiscussãoA atual RS foi concebida para identificar evidências na literatura científica tanto sobre distúrbios olfatórios/gustatórios acerca da apresentação clínica, prevalência e possíveis tratamentos específicos associados à COVID‐19.
Os seis estudos apresentaram prevalências diferentes para os DO e DG. O estudo com maior divergência dos demais nas prevalências de DO e DG foi o estudo chinês de Mao et a.,12 em que as prevalências de DO foram 19 vezes menores do que no estudo de Moein et al.14 e 14 vezes menores que no estudo de Lechien et al.;13 essas diferenças podem ser explicadas por duas possibilidades: 1) Os modelos de estudo, pois enquanto o estudo chinês, com menores prevalências de DO e DG, foi baseado apenas em dados de prontuários em que as queixas gustativas/olfativas podem ter sido negligenciadas, os demais estudos usaram ferramentas direcionadas para avaliação de olfato e paladar; 2) Os pacientes chineses apresentavam, de fato, poucas queixas olfatórias‐gustatórias.
Observamos que nos estudos chinês, iraniano e americano a média de idade foi maior do que nos estudos europeus; tal divergência pode ser explicada pela composição das amostras no tocante à gravidade dos quadros da COVID‐19, pois nos estudos asiáticos e ‐americanos havia pacientes com a forma severa da doença, mais comum em pacientes mais idosos e com comorbidades,19–22 enquanto nos grupo europeus somente existiam casos leve‐moderados.
O comportamento clínico dos DO e DG variou em diversos aspectos; observou‐se que a anosmia foi o DO mais prevalente e seu surgimento pode ocorrer antes mesmo dos sintomas/sinais da COVID‐19. Há evidências de que a perda de olfato pode não apenas ser um marcador clínico para a infecção por SARS‐CoV‐2, como também pode ajudar a estratificar o grau da doença no início da infecção. Considerando as dificuldades em termos de saúde pública para feitura e aquisição dos resultados em tempo hábil da RT‐PCR, a valorização desses distúrbios em tempos de pandemia de COVID‐19 pode ser útil na orientação de isolamento imediato mesmo antes do acesso ao resultado do exame, favorece a prevenção da disseminação do vírus. Diferentemente dos quadros de DO por outras infecções virais, os DO na maioria dos pacientes com COVID‐19 não estavam associados à obstrução nasal ou rinorreia. A recuperação do DO ocorre, na maioria dos casos, nas duas primeiras semanas, enquanto apenas 3,3% conseguem a recuperação do olfato/paladar após esse período e ainda não se sabe se os demais que permanecem com DO podem recuperar o olfato em longo prazo. O neuroepitélio olfatório tem considerável capacidade regenerativa, leva à melhoria espontânea do olfato, em graus variáveis ao longo do tempo,23 se a camada de células‐tronco não for marcadamente danificada.24–26 Sobre as DG, informações detalhadas não foram encontradas; porém, a associação dos DG com os DO foram significantes e sua recuperação do paladar dependeu da recuperação do olfato.
A variabilidade do espectro clínico dos DO/DG na COVID‐19 é grande e certamente definida por características biológicas tanto virais como celulares e moleculares dos pacientes que variam de acordo com a etnia; dos seis estudos avaliados, os dois estudos que não tinham formas graves da COVID‐19 foram compostos por pacientes apenas europeus; entretanto, mantiveram prevalências altas de DO e DG. Mutações de proteínas de superfície (proteína Spike ‐ S e a proteína Nucleocapsídica ‐ N) do SARS‐CoV‐2 em diferentes regiões da China já foram observadas,27 o que pode modificar o comportamento biológico do vírus em relação à afinidade aos tecidos.20 A enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2) atua como receptor para SARS‐CoV‐2, especialmente no bulbo olfatório,28 de modo que algumas das suas variantes observadas em diferentes etnias poderiam reduzir a sua capacidade receptora à proteína S do vírus e modificar a suscetibilidade, os sintomas e os desfechos clínicos;29 existem no epitélio olfatório humano expressões relativamente altas da ECA2 e da Proteína Transmembrana Serina 2 (TRMPSS2);30 a expressão não neuronal de ECA2/TRMPSS2 pode, possivelmente, tornar o epitélio olfatório um reservatório de vírus.30 A expressão de TMPRS2 parece ser maior em comparação com a de ECA2 e ocorre tanto em neurônios como em células não neuronais do epitélio olfatório e com padrão em mosaico, sugere que alguns neurônios olfativos podem ser mais vulneráveis à infecção viral.31,32
Em relação a tratamentos específicos, não foram encontradas evidências de medicamentos específicos eficazes na recuperação das funções olfatória/gustatória. A lavagem nasal predominou nos grupos estudados.
Assim, pacientes com COVID‐19 de diversas etnias foram avaliados, apresentaram altas prevalências de comprometimento do olfato/paladar, as mulheres foram as mais afetadas, significativamente; diferentemente das outras etiologias virais, o SARS‐CoV‐2 pode levar a perdas das funções olfativas/gustativas mesmo sem obstrução nasal/rinorreia e com início dos DO/DG mesmo antes dos sinais/sintomas clínicos da COVID‐19. Há evidências de que os DO/DG sejam fortes preditores de infecção pelo SARS‐CoV‐2, pode‐se recomendar o isolamento do paciente, já a partir da consulta médica e ainda sem o resultado do exame laboratorial, para evitar a disseminação do vírus. A recuperação do olfato/paladar, quando ocorre, geralmente se dá nas duas primeiras semanas após a resolução do quadro da COVID‐19. Não foram identificadas evidências científicas para tratamentos eficazes para qualquer dos distúrbios.
ConclusãoOs estudos mostraram que podem ocorrer distúrbios tanto olfativos como gustatórios de intensidades variáveis e com início prévio aos sintomas gerais na infecção pelo SARS‐CoV‐2, devem‐se considerar tais distúrbios como parte dos sintomas que podem estar presentes mesmo em quadros leves de COVID‐19. Não há ainda evidências científicas de tratamentos específicos para tais distúrbios relacionados à COVID‐19.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Medlinevia Pubmed |
(COVID‐19 OR 2019‐nCoV OR 2019 novel coronavirus pneumonia OR SARS‐CoV OR SARS‐CoV‐2 OR sars coronavirus OR coronavirus OR coronavirus infection OR coronavirus COVID‐19 OR novel coronavirus) AND (COVID‐19 clinical features OR olfactory disorders OR olfaction disorders OR taste disorders) |
LILACS |
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FILTROS: (ANO 2019‐2020), (TIPO DE ARTIGO: ORIGINAL) |
SCOPUS |
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COCHRANE CLINICALTRIALS |
(COVID‐19 OR 2019‐nCoV OR 2019 novel coronavirus pneumonia OR SARS‐CoV OR SARS‐CoV‐2 OR sars coronavirus OR coronavirus OR coronavirus infection OR coronavirus COVID‐19 OR novel coronavirus) AND (COVID‐19 clinical features OR olfactory disorders OR olfaction disorders OR taste disorders) |
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(COVID‐19 OR 2019‐nCoV OR 2019 novel coronavirus pneumonia OR SARS‐CoV OR SARS‐CoV‐2 OR sars coronavirus OR coronavirus OR coronavirus infection OR coronavirus COVID‐19 OR novel coronavirus) AND (COVID‐19 clinical features OR olfactory disorders OR olfaction disorders OR taste disorders) |
Como citar este artigo: Costa KV, Carnaúba AT, Rocha KW, Andrade KC, Ferreira SM, Menezes PL. Olfactory and taste disorders in COVID‐19: a systematic review. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:781–92.
A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.