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Vol. 87. Núm. 4.
Páginas 486-488 (Julho - Agosto 2021)
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Páginas 486-488 (Julho - Agosto 2021)
Relato de caso
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Regressão espontânea de adenocarcinoma da glândula submandibular
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Otávio A. Curionia, Pedro de Andrade Filhob, Andreza de Jesus Pratesa, Abrão Rapoporta, Rogério Aparecido Dedivitisc,
Autor para correspondência
dedivitis.hns@uol.com.br

Autor para correspondência.
a Hospital Heliópolis, Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço/Otorrinolaringologia, São Paulo, SP, Brasil
b Loma Linda University Medical Center, Department of Otolaryngology/Head and Neck Surgery, Loma Linda, Estados Unidos
c Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina, Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, São Paulo, SP, Brasil
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Introdução

O desaparecimento de um câncer sem uma explicação satisfatória raramente é aceito no meio médico. Esse processo é chamado de “regressão” ou “remissão espontânea” e, em casos excepcionais, os pacientes são curados da doença. A definição formal como desaparecimento parcial ou completo de um tumor maligno na ausência de tratamento ou na presença de terapia inadequada foi criada pelo Dr. Tilden Everson e pelo Dr. Warren Cole na década de 1960.1 A incidência de regressão espontânea é estimada entre um em 60.000 a um em 140.000 casos de câncer, embora seja muito difícil defini‐la com base nos aspectos clínicos.2

A literatura médica é rica em relatos de casos de neoplasias confirmadas por exame anatomopatológico, com tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM), e mostra doenças generalizadas com regressão espontânea, que abrangem quase todos os tipos histológicos de câncer. Os exemplos incluem algumas neoplasias hematológicas, sarcoma, melanoma, neuroblastoma, astrocitoma, carcinoma de células de Merkel e vários sítios afetados pelo câncer (mama, pulmão, testículo, próstata, cervical, fígado, cólon, rim).

Na região de cabeça e pescoço, há descrições de regressão espontânea nas neoplasias de orofaringe, língua, assoalho bucal e laringe. No caso da glândula salivar, há relatos de regressão de tumor metastático de melanoma, carcinoma de células de Merkel e regressão de metástase pulmonar de carcinoma adenoide cístico da parótida. O mecanismo exato responsável pela remissão é desconhecido.

Relato de caso

Uma mulher de 51 anos procurou atendimento ambulatorial para avaliação de lesão tumoral em região submandibular esquerda havia 5 meses associada a pioria da dor. Havia história prévia de tabagismo por 38 anos. Ela apresentava assimetria facial com lesão de 7×5cm na glândula submandibular esquerda, fixada à mandíbula, sem outros linfonodos palpáveis no pescoço. A paciente apresentava paralisia do ramo marginal do nervo facial (fig. 1). A biópsia por punção aspirativa com agulha fina (PAAF) apresentou suspeita de malignidade e a tomografia computadorizada mostrou lesão na topografia da glândula submandibular esquerda, envolvia a mandíbula, sem invasão óssea aparente, e extenso tecido necrótico com infiltração do assoalho da boca (fig. 2). A PET/CT mostrou uma lesão que envolvia a glândula submandibular esquerda (SUV mtox: 17,1) e linfonodos cervicais em nível II, III, V à esquerda e nível IV bilateral (SUV mtox: 10,7). Uma biópsia incisional foi feita sob anestesia local e os cortes histológicos mostraram um carcinoma infiltrativo pouco diferenciado; a análise imuno‐histoquímica foi positiva para citoqueratina/CK‐6, confirmou a diferenciação epitelial. O diagnóstico de adenocarcinoma de baixo grau foi definido. Enquanto a paciente aguardava o tratamento cirúrgico, ela apresentou sinais de regressão tumoral e o tumor desapareceu completamente após 4 meses. Novos exames de imagem com PET‐CT foram feitos e mostraram resolução metabólica completa da lesão. A paciente está em acompanhamento ambulatorial sem evidência da doença após acompanhamento de 75 meses (fig. 3).

Figura 1.

Aspecto clínico em repouso, evidencia assimetria facial e paralisia do ramo marginal do VII nervo craniano.

(0,11MB).
Figura 2.

Tomografia computadorizada: tumor de glândula submandibular esquerda localmente avançado.

(0,06MB).
Figura 3.

Ausência de lesões cervicais 72 meses após a hospitalização. A tomografia computadorizada manteve a resolução do tumor da glândula submandibular esquerda 75 meses após a remissão.

(0,11MB).
Discussão

Existem vários casos de cura espontânea de neoplasias malignas; entretanto, neoplasias de cabeça e pescoço que se enquadram nessa definição são incomuns. Não encontramos relatos de regressão espontânea de adenocarcinoma de glândula salivar nas bases de dados de pesquisa Pubmed, VHL, Capes e Cochrane. Existem descrições de regressão de metástases de melanoma em câncer de glândula salivar,3 carcinoma de células de Merkel4 e regressão espontânea de metástase pulmonar de carcinoma adenocístico de parótida.5

As teorias atuais mais aceitas para o desencadeamento da regressão espontânea de tumores envolvem processos infecciosos e hipoglicemia como geradores de resposta imunológica exacerbada, responsáveis pelo mecanismo de cura. A teoria da imunomodulação ajudou a compreensão médica da regressão espontânea, que pode ser vista como a interação do câncer com o hospedeiro determina uma eliminação incompleta, um equilíbrio entre forças ou um escape da resposta imunológica.6

Em condições ideais, os elementos inatos e adaptativos do sistema imunológico trabalham juntos para eliminar o câncer (muitas vezes de forma imperfeita) com células T regulatórias (CD4+) e citotóxicas (CD8+), células dendríticas, células Natural‐Killers (NK) e macrófagos com uma série de proteínas secretadas por ativação imune, como interferon gama, interleucina 12 e fator de necrose tumoral (TNF) que atuam em harmonia. A regressão espontânea pode, em alguns casos, ser uma manifestação desse processo dinâmico.7

Uma das chaves para esse processo parece ser a estimulação da imunidade inata. Em uma série de relatos de casos de cura espontânea, foi levantada a hipótese de que o estímulo de uma condição infecciosa ajuda o sistema imunológico inato a reconhecer as células tumorais.8

Outra teoria em estudo que pode corroborar os fenômenos da cura espontânea é a da hipoglicemia/hiperglicemia.9 Essa teoria argumenta que um estímulo de hipoglicemia externa, respondido com gliconeogênese e hiperglicemia reacional, provoca uma ativação de células T.10

Conclusão

Este é um evento incomum e o mecanismo exato para essa regressão é desconhecido.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse

Referências
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Como citar este artigo: Curioni OA, Andrade Filho P, Prates AJ, Rapoport A, Dedivitis RA. Spontaneous regression of adenocarcinoma of submandibular gland. Braz J Otorhinolaryngol. 2021;87:486–8.

A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial.

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