O Brasil, o segundo país mais populoso das Américas, enfrenta uma crise de saúde pública com mais de 66 mil casos confirmados e cinco mil mortes por Covid‐19. Devido à demanda mundial por testes para identificar pacientes infectados com SARS‐CoV‐2, as estratégias sanitárias são profundamente prejudicadas pela falta de testes que possam orientar o isolamento correto e imediato de casos positivos de Covid‐19. Nas últimas semanas, observou‐se que a perda de olfato/paladar associada à Covid‐19 tem sido uma queixa frequente e, principalmente, identificada quando se avalia o paciente com ferramentas apropriadas. No entanto, quão úteis são esses sintomas na prática clínica e, principalmente, na ausência de testes para SARS‐CoV‐2?
Em estudo recente, Menni et al.1 mostraram que a combinação de perda de olfato/paladar, febre e tosse era preditiva para teste positivo para Covid‐19 com sensibilidade de 0,54 (0,44; 0,63), especificidade 0,86 (0,80; 0,90) e, em geral, a perda de olfato/paladar teve um valor preditivo positivo de 61,7%.
Um estudo multicêntrico europeu também mostrou que anosmia e ageusia estavam independente e fortemente associados à positividade para Covid‐19 (anosmia: aOR=10,9; 95% IC: 5,08?23,5; ageusia: aOR=10,2; 95% IC: 4,74?22.1).2 No Brasil, sem testes suficientes para uma avaliação populacional maciça, principalmente em regiões com poucos recursos diagnósticos e pobres, a recomendação para isolar um paciente com queixa de anosmia/ageusia, já a partir da própria consulta médica, torna‐se uma estratégia de saúde pública para tentar controlar a propagação do vírus.
De fato, a perda de olfato/paladar não depende de obstrução nasal/rinorreia e pode começar antes mesmo dos sinais/sintomas de Covid‐19. Torna‐se sinal de alerta mesmo em pacientes oligossintomáticos. Principalmente no estágio inicial da doença, quando ocorrem alta reprodução e transmissibilidade do vírus; a recuperação do olfato/paladar, quando há, geralmente ocorre nas duas primeiras semanas após a resolução do Covid‐19.3 Entretanto, semana a semana surgem novas interpretações. Acreditamos que a valorização e o questionamento ativo ao paciente acerca de distúrbios olfatório/gustatório podem ajudar, não apenas aos otorrinolaringologistas, mas toda a equipe de saúde que trabalha na linha de frente no controle da pandemia.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse
Como citar este artigo: Costa KV, Carnaúba AT. Smell and taste disorders: warning signs for SARS‐CoV‐2 infection. Braz J Otorhinolaryngol. 2020;86:393–4.