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Vol. 82. Núm. 4.
Páginas 433-441 (Julho 2016)
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Avaliação do equilíbrio corporal no comprometimento cognitivo leve através de sistema eletromagnético tridimensional
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Ana Paula Oliveira Borgesa, José Ailton Oliveira Carneirob, José Eduardo Zaiac, Antonio Adilton Oliveira Carneirod, Osvaldo Massaiti Takayanaguie
a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil . Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, SP, Brasil
b Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Jequié, BA, Brasil
c Ciências Biológicas, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP), São Paulo, SP, Brasil. Programa de Mestrado e Doutorado em Promoção de Saúde, Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, SP, Brasil
d Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil. Departamento de Física e Matemática, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FFCLRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil
e Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil. Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil
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Tabela 1. Características demográficas, antropométricas, escores do MEEM e caracterização físico-funcional nos grupos diagnósticos
Tabela 2. Parâmetros da oscilação corporal dos dois grupos em diferentes condições sensoriais
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Introdução: Idosos com alteração cognitiva apresentam maior risco de quedas; assim, é importante compreender as primeiras fases do declínio cognitivo.

Objetivo: Comparar o equilíbrio corporal entre idosos com e sem comprometimento cognitivo leve através de um sistema tridimensional.

Método: Trinta idosos com comprometimento cognitivo leve e 30 idosos saudáveis foram selecionados. A posturografia estática foi realizada utilizando equipamento eletromagnético tridimensional, e foram avaliados os parâmetros deslocamento máximo, velocidade média e trajetória total. Foi realizada comparação das variáveis estabilométricas com olho aberto e olho fechado intragrupo e intergrupos, e foi estabelecida a relação entre o Mini Exame do Estado Mental e a trajetória total de todos os idosos.

Resultados: A análise entre olho aberto e olho fechado no grupo de controle evidenciou uma diferença significativa no deslocamento anteroposterior máximo; no grupo com comprometimento cognitivo leve, houve diferença significativa em todas as variáveis estabilométricas. Foi observada diferença significativa entre os grupos em todas as variáveis na condição de olho fechado. Houve forte correlação entre desempenho cognitivo e trajetória total.

Conclusão: As avaliações evidenciaram diminuição do equilíbrio nos idosos com comprometimento cognitivo leve. O deslocamento anteroposterior pode ser um sinal precoce de comprometimento do controle postural, e a avaliação com restrição visual pode ser útil na detecção de pequenas instabilidades posturais.

Palavras-chave:
Idoso
Comprometimento cognitivo leve
Equilíbrio postural
Privação sensorial

Introduction: Elderly people with cognitive impairment are at greater risk for falls; thus, an understanding of the earliest stages of cognitive decline is necessary.

Objective: To compare postural balance between elderly people with and without mild cognitive impairment using a three-dimensional system.

Methods: Thirty elderly people with mild cognitive impairment and thirty healthy elderly subjects were selected. Static posturography was performed using three-dimensional electromagnetic equipment and the following parameters were evaluated: maximum displacement, mean speed and total trajectory. Open- and closed-eye stabilometric variable comparisons between groups and within each group were carried out, and a relationship between the Mini Mental State Examination and the total trajectory of all elderly subjects was determined.

Results: The analysis among open- and closed-eye conditions showed a significant difference in maximum anteroposterior displacement in the control group and a significant difference in all stabilometric variables in the mild cognitive impairment group. A significant difference between the groups in all variables in the closed-eye condition was observed. There was a strong correlation between cognitive performance and total trajectory.

Conclusion: Evaluations showed decrease in balance in elderly people with mild cognitive impairment. Presence of anteroposterior displacement can be an early sign of postural control impairment, and the evaluation with visual restriction can be useful in detecting small postural instabilities.

Keywords:
Elderly
Mild cognitive impairment
Postural balance
Sensory deprivation
Texto Completo

Introdução

A presença de déficit cognitivo é um importante fator de risco para alterações no desempenho motor e equilíbrio corporal.1-4 Estudos mostram que a incidência de quedas em pessoas com comprometimento cognitivo é estimada como o dobro da dos idosos cognitivamente intactos.5 Uma abordagem para diminuir o risco de quedas nessa população é compreender as primeiras fases do declínio cognitivo.

O comprometimento cognitivo leve (CCL) é uma condição clínica definida por critérios clínicos, cognitivos e funcionais. Nesta entidade, há um declínio cognitivo maior que o esperado para a faixa etária e escolaridade do indivíduo, mas que não interfere significativamente nas atividades funcionais diárias.6

Idosos com CCL apresentam risco aumentado não apenas para conversão em demência, mas para o declínio da mobilidade e quedas. Boyle et al.7 sugeriram que essas alterações motoras podem preceder o diagnóstico do declínio cognitivo. Embora o mecanismo de aumento do risco de quedas por prejuízo cognitivo não seja completamente compreendido, sabe-se que deficiências nas habilidades cognitivas podem reduzir recursos de atenção durante a habilidade postural. Assim, o CCL representa uma oportunidade para intervir na trajetória do declínio cognitivo e funcional em idosos.8

Técnicas instrumentais têm sido usadas para avaliar o equilíbrio, além das avaliações baseadas em julgamento clínico, dentre elas, a posturografia computadorizada.9 No entanto, uma das grandes dificuldades para a sua utilização é o custo do equipamento (plataforma de força) e as restrições para seu transporte.

Dentre as recentes tecnologias que estudam a oscilação corporal, o sistema de sensores eletromagnéticos tridimensional detecta pequenas oscilações do corpo, permitindo a investigação direta da cinemática do movimento e apresenta menor custo e maior portabilidade em relação à plataforma de força.10-17

Durante o processo de envelhecimento, ocorre uma série de modificações nos sistemas motor, sensorial e cognitivo, resultando num aumento da oscilação corporal.1,2 Uma das formas de avaliar a contribuição dos sistemas sensoriais no controle postural é através da manipulação das informações durante a postura ereta.18

Nesse sentido, a avaliação da oscilação corporal em diferentes condições sensoriais pode ser útil na detecção do desequilíbrio em idosos com CCL. Assim, o objetivo deste estudo foi comparar o equilíbrio corporal estático entre idosos com e sem CCL, utilizando dados de um sistema tridimensional, nas condições de olhos abertos e fechados.

Método

Participantes

Trata-se de um estudo de corte transversal, descritivo e comparativo. Foram definidos dois grupos de 30 idosos: grupo controle (idosos sem comprometimento cognitivo) e grupo com CCL.

Foi realizado o cálculo amostral baseado no levantamento do número de atendimentos e em estudos anteriormente realizados no ambulatório, além de estimativas baseadas na literatura, por meio do programa estatístico G*Power 3.1®, chegando ao indicativo da amostra de, no mínimo, 27 sujeitos para cada grupo.

Os participantes do grupo CCL foram selecionados posteriormente à avaliação multidisciplinar no ambulatório, e os do grupo controle foram selecionados no próprio hospital, provenientes de outros ambulatórios.

Para definição dos grupos diagnósticos, foram incluídos no grupo CCL idosos com diagnóstico clínico, segundo critérios elaborados por Petersen et al.19 Estes deveriam apresentar comprometimento cognitivo, com predomínio da função mnemônica (CCL do tipo amnéstico), sem comprometimento da capacidade funcional, ausência de demência pelos critérios da Classificação Internacional de doenças, 10º edição (CID-10), e pelo Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 4º edição (DSM-IV), por alterações na bateria de testes neuropsicológicos e pelo Clinical Dementia Rating (CDR) igual a 0,5. O grupo controle não deveria apresentar evidência de comprometimento cognitivo ou funcional segundo avaliação clínica e neuropsicológica.20

Foram incluídos nos dois grupos aqueles que tivessem entre 65 e 75 anos, pareados por idade, de ambos os sexos e escolaridade mínima de quatro anos de instrução formal. Foram excluídos os idosos que usassem dispositivos metálicos no corpo e marcapasso, alterações de memória secundárias a outra doença degenerativa, disfunções cardiovasculares graves, comprometimento visual e auditivo não corrigidos, alterações osteomusculares e neurológicas prévias que influenciassem o equilíbrio, disfunções vestibulares, queixa de tontura e/ou vertigem e uso de drogas psicotrópicas. Além disso, aqueles com diminuição significante nas atividades diárias, histórico de quedas (definida como um evento inesperado no qual o sujeito venha a se posicionar no solo ou nível inferior ao seu)21 e uso de dispositivos para marcha também foram excluídos do estudo.

Todos os sujeitos foram informados sobre as avaliações e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido após a aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética da Instituição (nº 5156/2010).

Procedimentos e instrumentos

Inicialmente, foram coletadas as informações pessoais, antropométricas, do estado geral da saúde e do desempenho cognitivo através do miniexame do estado mental (MEEM). Uma avaliação do desempenho físico-funcional foi realizada no intuito de conhecer os aspectos funcionais dos idosos e eliminar a possibilidade de que possíveis déficits sensoriais e motores comprometessem o teste de equilíbrio corporal estático. Para isso, foi realizado o teste Freiburg de acuidade visual na versão modificada,22 manobra de Dix-Hallpike,23 uso do diapasão nas saliências ósseas bilaterais e o Short Physical Performance Battery (SPPB).24

O equilíbrio corporal estático foi avaliado usando um sistema de sensores ele tromagnéticos tridimensionais Polhemus® Patriot (fig. 1). A posição e a orientação espacial dos idosos foram registradas em tempo real por meio da apresentação gráfica dos movimentos nos eixos anteroposterior, mediolateral e vertical (posições x, y, z e ângulos de orientação θ, γ, ρ ), entre o sensor receptor fixado na pele sobre a região sacral (próximo ao centro de massa) e o sensor transmissor que foi colocado sobre um suporte desacoplado do corpo a uma distância de, aproximadamente, 40 cm, e na mesma altura do sensor receptor.10-14 Os dados adquiridos pelo sistema foram transferidos para um notebook por meio de interface USB e do ambiente LabView 8.0, com software específico. A frequência de aquisição da amostragem foi de 100 hz.

Figura 1 Localização dos sensores eletromagnéticos. Tx, transmissor e representação dos três planos; S1, região sacral. Adaptado de Carneiro et al.10 (2013).

Para estabelecer um padrão de sinal e haver confiabilidade dos dados, foi verificado o desvio da linha de base do equipamento Polhemus e feita a calibração antes das avaliações, com a movimentação para frente em 5 cm da bobina do sensor e sobre uma superfície plana. Uma vez que o sistema tridimensional funciona como um sensor de movimento, ele deveria detectar o mesmo deslocamento previamente conhecido.

Durante a avaliação da oscilação corporal, os idosos permaneceram em posição ortostática, apoio bipodal, com os membros superiores posicionados ao lado do corpo e os pés descalços lado a lado, paralelamente à largura da pelve, sobre uma plataforma de madeira medindo 1 3 50 3 50 cm e mantendo uma distância de aproximadamente 12 cm entre seus calcanhares durante as avaliações.25 Além disso, foram instruídos a manterem-se imóveis o máximo de tempo possível, e não movimentarem os membros superiores. Nenhuma comunicação foi permitida durante o teste.

O teste foi realizado em duas condições sensoriais, durante 60 segundos, para cada posição, na seguinte ordem: condição olhos abertos (OA) e condição olhos fechados (OF). Na condição de OA, todos os idosos foram orientados a manter fixação ocular num ponto colocado a uma distância de um metro, na altura dos olhos.

Os parâmetros de oscilação corporal (variáveis estabilométricas) analisados foram deslocamento máximo anteroposterior (AP) e deslocamento máximo mediolateral (ML), trajetória total e velocidade média total.10-17 O cálculo variável/altura foi realizado para a análise estatística, com correção dos dados para a altura dos idosos.

Análise estatística

Para verificação da homogeneidade da amostra, foi aplicado o teste de Kolmogorov-Smirnov. As comparações das variáveis antropométricas, demográficas, escolaridade, físico-funcional e escores do MEEM entre os grupos controle e CCL foram feitas através do teste t de Student. A proporção entre os sexos em cada grupo foi verificada através do teste de Fischer. Para a comparação entre as variáveis estabilométricas para as condições OA e OF, dentro de cada grupo, foi utilizado teste de Wilcoxon e, entre grupos, o teste de Mann-Whitney. O coeficiente de Spearman foi utilizado para testar a correlação entre as variáveis com e sem ajuste para a altura dos participantes e entre os escores do MEEM e trajetória total, nas duas condições sensoriais. As análises estatísticas foram conduzidas usando o software SPSS (SPSS for Windows, versão 16.0-SPSS Inc., EUA), considerando um nível de significância de 5%. Para a confecção dos gráficos foi utilizado o pacote estatístico Origin®, versão 6.0 (Microcal Origin®, 6.0, EUA).

Resultados

Na tabela 1, é possível observar que não houve diferença significativa entre os grupos diagnósticos em relação a sexo, idade, peso, altura e escolaridade, e diferença expressiva nos escores do MEEM. Com isso, pôde-se observar que os idosos do grupo controle apresentaram melhor desempenho cognitivo. Todos os idosos apresentaram sensibilidade proprioceptiva preservada, resposta negativa à manobra de Dix-Hallpike, acuidade visual preservada e conseguiram executar o teste SPPB.

A tabela 2 apresenta as variáveis de oscilação corporal dos grupos nas condições de OA e OF, além das comparações entre as condições sensoriais intra e intergrupos. A análise entre OA e OF no grupo controle evidenciou uma diferença significativa apenas no deslocamento máximo AP (p < 0,01), enquanto no grupo CCL foi observada importante diferença entre todas as variáveis estabilométricas (p < 0,001).

Ao realizar a comparação entre os grupos na condição de OA, não foi observada diferença expressiva entre as variáveis (p > 0,05). Na condição de OF, diferenças significativas foram observadas entre os grupos para todas as variáveis (p < 0,01). As variáveis com correção para altura não foram apresentadas por demonstrarem forte cor relação (r: 0,91; p < 0,001) com as variáveis sem correção.

A figura 2 mostra os gráficos do estatocinesigrama, representando a trajetória total da oscilação corporal no eixo AP em relação ao ML, durante 60 segundos, de um idoso saudável e um idoso com CCL do mesmo sexo, e com valores antropométricos homogêneos nas diferentes condições sensoriais. Através desses gráficos, é possível observar que, quanto menos informação sensorial o idoso dispõe, maior é a sua oscilação.

Figura 2 Estatocinesigrama de um idoso saudável e um com comprometimento cognitivo leve (CCL). A, olhos abertos (OA); B, olhos fechados (OF) no sentido anteroposterior (AP) e mediolateral (ML).

A figura 3 mostra o estabilograma dos mesmos idosos nas diferentes condições sensoriais. O gráfico mostra as amplitudes de oscilação corporal em relação ao tempo de aquisição nos eixos AP e ML. Os estabilogramas permitem a identificação dos períodos do teste em que o indivíduo obteve maiores picos de oscilações (maiores riscos de quedas).

Figura 3 Estabilograma de um idoso saudável e um com comprometimento cognitivo leve (CCL). A, olhos abertos (OA) no sentido anteroposterior (AP); B, olhos abertos (OA) no sentido mediolateral (ML); C, olhos fechados (OF) no sentido anteroposterior (AP); D, olhos fechados (OF) no sentido mediolateral (ML).

Na análise de correlação entre os escores do MEEM e a trajetória total das condições sensoriais AO e OF, considerando todos os idosos (não separados por grupos), pôde-se constatar uma correlação significante (AO: r –0,65; p < 0,01 e OF: r: –0,92; p < 0,01), sendo que, à medida que aumentava o valor do MEEM, o valor da trajetória total diminuía para toda a amostra.

Discussão

Embora muitas pesquisas tenham se dedicado a estudar quedas em idosos com demência (principalmente Azheimer), poucos estudos têm sido direcionados aos idosos com CCL. Com isso, a incidência de quedas nessa população e seus fatores de risco permanecem mal definidos. Neste estudo, o controle postural estático em pé e suas alterações na presença de CCL foram examinados. Tradicionalmente, a posição em pé tem sido quantificada com o uso de características da oscilação corporal e mudanças no centro de pressão. Recentemente, novos aparatos tecnológicos para essa avaliação têm sido estudados. Até o limite de nosso conhecimento, este foi o primeiro estudo a analisar o equilíbrio corporal estático de idosos com CCL utilizando um sistema tridimensional nas condições sensoriais OA e OF, e as análises dos dados revelaram um menor equilíbrio corporal nesse grupo, corroborando com os outros estudos posturográficos feitos com essa população.26,27

Para o estudo, foram selecionados 60 idosos. As proporções entre homens e mulheres foram semelhantes nos grupos, para que as diferenças observadas entre eles não fossem atribuídas à diferença na distribuição do sexo. Situação semelhante aconteceu em outros estudos.3,4,26 A distribuição da idade foi homogênea, controlando, assim, o seu efeito nos resultados, visto que a idade é um conhecido fator de risco para quedas, e não foram observadas diferenças significantes entre os grupos em relação às variáveis antropométricas.

A análise do equilíbrio corporal estático em diferentes condições visuais possibilitou a análise da influência da visão para a manutenção do equilíbrio nos dois grupos avaliados. Foi possível constatar que não houve diferença expressiva nas variáveis estabilométricas entre os grupos controle e CCL na condição OA, quendo todos os idosos utilizaram os três sistemas sensoriais para manutenção do equilíbrio. Porém, na condição OF, diferença significante foi observada entre os grupos em todas as variáveis estabilométricas, sendo que o grupo CCL apresentou maior oscilação corporal, comparado com o grupo controle, evidenciando maior necessidade da informação visual para manter o equilíbrio no grupo CCL.

Estudos que utilizaram a posturografia em idosos com CCL ainda são limitados. Shin et al.,3 Leandri et al.26 e Merlo et al.27 e fizeram essa investigação. No entanto, o estudo de Leandri et al.26 já chama atenção para diferenças encontradas entre os grupos CCL e DA. Esses pesquisadores encontraram diferenças significantes no deslocamento AP entre os grupos controle e CCL e, posteriormente, entre CCL e DA. Não houve diferença significativa na variável de deslocamento ML entre os grupos CCL e controle, mas sim entre CCL e DA. Dessa maneira, o deslocamento AP mostrou um aumento constante entre os três grupos avaliados, mostrando que podem ocorrer alterações precoces no equilíbrio desses idosos, em paralelo com alterações motoras já observadas em testes clínicos.28-30

Taylor et al.31 mostraram que idosas com CCL possuíam mais fatores de risco para quedas que idosas saudáveis, com maior alteração nos testes clínicos e maior oscilação do corpo, principalmente com OF, corroborando estudos feitos por Franssen et al.,29 Boyle et al.32 e Liu -Ambrose et al.33 A maior oscilação corporal com OF no grupo CCL observada nestes estudos, em comparação com o grupo controle, confirma a importância da visão na manutenção da estabilidade corporal. No presente estudo, a ausência da informação visual gerou maior oscilação corporal no grupo CCL, replicando os achados encontrados nos estudos citados acima. Esses resultados apontam, ainda, que pode ocorrer uma sobrecarga nos outros sistemas sensoriais (vestibular e somatossensorial), a fim de manter o equilíbrio e evitar a queda.

Wu et al.,34 após testarem a capacidade de integração multissensorial de idosos com CCL e DA, observaram que o tempo de reação, não só dos idosos com DA, mas também com CCL, ocorreu mais tarde do que em indivíduos saudáveis. Este achado indica que os déficits cognitivos encontrados em idosos com CCL já podem levar a menor integração multissensorial, o que diminui seu desempenho funcional quando comparados com idosos saudáveis.

Na comparação entre os mesmos grupos com AO e OF, os idosos do grupo controle apresentaram diferença significante apenas no deslocamento máximo AP, enquanto o grupo CCL apresentou importante diferença entre todas as variáveis estabilométricas avaliadas.

A importância do sistema visual para o controle postural está principalmente relacionada à estabilização da oscilação corporal. Desses parâmetros oscilatórios, o deslocamento AP é o mais frequentemente relacionado a estabilidade do corpo, uma vez que esse movimento é feito pela ação do tornozelo e, posteriormente, pelo quadril. O controle visual parece ser um importante fator para o controle postural nas atividades dinâmicas. Na postura estática, estudos não evidenciaram diferenças na oscilação corporal na ausência da visão em idosos saudáveis, exceto no deslocamento AP.26,35-37

Sarabon et al.35 e Fujita et al.37 mostraram uma diminuição na eficiência do controle postural de acordo com a idade em indivíduos saudáveis, mas não evidenciaram diferenças na oscilação corporal com OA e OF entre os grupos de diferentes idades. Esses resultados se opõem a estudos que ressaltam a maior dependência da informação visual em idosos.38

Já em idosos com CCL, a informação visual parece ter um papel mais importante no controle do equilíbrio corporal, uma vez que a compensação sensorial não ocorre de maneira tão eficiente, em função da menor integração sensorial que eles apresentam.34 Como esses idosos possuem um menor aporte somatossensorial nos membros inferiores e uma possível alteração no sistema vestibular, o sistema visual é mais sobrecarregado, e a privação visual desencadeia a maior alteração do equilíbrio estático. Esse resultado foi confirmado por Shin et al.3 e Leandri et al.26 em estudos com CCL e idosos saudáveis, mostrando que a privação visual foi associada, significativamente, ao aumento do deslocamento corporal no grupo CCL, principalmente do AP.

Outra hipótese que pode justificar a maior necessidade das informações visuais no grupo CCL é a relação entre essa informação sensorial e a cognição. Sabe-se que as aferências visuais são uma importante fonte de informação para a formação da orientação postural. A diminuição dessas informações leva à maior necessidade do envolvimento cognitivo no processamento sensoriomotor.38

Recursos atencionais e executivos desempenham um papel importante no declínio da memória espacial, normalmente associada ao envelhecimento saudável. Porém, estudos apontam para a maior diminuição dessa memória espacial em idosos com CCL. Somados a isso, a alteração na substância branca parietal, no córtex entorrinal e no cingulado posterior podem prejudicar o emprego bem-sucedido de recursos de atenção para o controle postural nesses idosos.39

A relação entre o desempenho cognitivo através do MEEM e a trajetória total nas condições sensoriais AO e OF de todos os participantes foi realizada através de uma análise de correlação. Pode-se observar uma correlação moderada entre MEEM e ao, e forte entre MEEM vs. OF, evidenciando que o aumento no escore do MEEM coincide com a diminuição no valor da trajetória total, ou seja, os idosos com melhor desempenho cognitivo oscilaram menos na postura em pé. Essa associação também foi encontrada em outros estudos.26,40,41 Estes resultados indicam que a função cognitiva é um aspecto importante nesses idosos, e que avaliações do desempenho motor podem ser sensíveis, comparativamente aos testes tradicionais de função cognitiva, em identificar pessoas afetadas nas primeiras fases da disfunção cognitiva.

Deve-se destacar que a diminuição do equilíbrio em idosos com CCL tem um significado clínico além do risco de quedas. Evidências sugerem que esse declínio está relacionado com o risco aumentado de DA.28 É possível que pessoas com CCL tenham maior comprometimento fisiológico que aquelas sem CCL, devido às anormalidades estruturais e funcionais do cérebro.42

Embora escalas de avaliação clínica para equilíbrio sejam utilizadas, alguns desses testes podem não ser tão sensíveis para detectar níveis leves de disfunção do equilíbrio, como o encontrado nos estágios iniciais de comprometimento cognitivo.29 Tecnologias mais recentes que utilizam transdutores magnéticos para detectar a oscilação corporal e transferência de peso durante a postura estática ou dinâmica oferecem mensurações mais sensíveis para avaliar pequenas alterações no equilíbrio.9

Nesse sentido, diversos estudos avaliaram o equilíbrio corporal utilizando o sistema de sensores eletromagnéticos tridimensional.10-17 O uso desta ferramenta, neste estudo, mostrou-se útil na definição das metas de reabilitação e na obtenção de importantes informações sobre o acompanhamento dos resultados terapêuticos. Uma das suas maiores vantagens é que ele pode ser transportado para diferentes locais e possui um reduzido custo de aplicação, além de fornecer de dados simples para análise e interpretação dos dados.

A implicação clínica desse estudo é que a avaliação de riscos de quedas deve ser um componente fundamental no manejo clínico de idosos com CCL. Especificamente, estudos sugerem a inclusão de medidas de oscilação corporal para essa população.33 Talvez, alterações dos parâmetros estabilométricos, particularmente o AP, possam ser um sinal precoce de comprometimento do controle postural, e avaliações com OF possam ser úteis para distinguir melhor as pequenas instabilidades posturais, devido ao envelhecimento e aos processos patológicos que afetam o controle postural. A detecção precoce de anormalidades no controle postural, seguida de adequada reabilitação, modificações do ambiente e recomendações, pode ajudar a prevenir quedas e melhorar a qualidade de vida desses idosos.

Conclusão

As avaliações evidenciaram a diminuição do equilíbrio corporal nos idosos com CCL. Além disso, o deslocamento AP pode ser um sinal precoce de comprometimento do controle postural, e a avaliação com restrição visual pode ser útil na detecção de pequenas instabilidades posturais.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.


Recebido em 8 de junho de 2015;

aceito em 17 de agosto de 2015

DOI se refere ao artigo: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.08.023

* Autor para correspondência.

E-mail: anapoborges@gmail.com (A.P.O. Borges).

Como citar este artigo: Borges APO, Carneiro JAO, Zaia JE, Carneiro AAO, Takayanagui OM. Evaluation of postural balance in mild cognitive impairment through a three-dimensional electromagnetic system. Braz J Otorhinolaryngol. 2016;82:433-41.

☆☆ Instituição: Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRPUSP), Ribeirão Preto, SP, Brasil.

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Brazilian Journal of Otorhinolaryngology
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